O ano de 2020 trouxe
para os produtores rurais muitos desafios frente a uma pandemia, além de
prejuízos causados por uma severa estiagem. No entanto, surgiram alguns
aspectos positivos como, por exemplo, a publicação da chamada Nova Lei do Agro.
A boa produtividade da safra e preços favoráveis ajudaram a agropecuária, setor
que, praticamente, não parou neste período de isolamento social.
O advogado Frederico Buss, sócio da HBS Advogados, ressalta que no Rio Grande
do Sul, mesmo com este cenário mercadológico favorável, os produtores gaúchos
sofreram com a falta de chuvas na safra de verão 2019/2020, a mais grave desde
2004/2005, segundo apontam os especialistas. Coloca que houve um forte impacto
nas lavouras de milho e soja, assim como na pecuária leiteira, e, no segundo
semestre deste ano, a estiagem voltou a preocupar. Para atender a este
problema, o governo federal editou uma resolução do Banco Central prevendo a possibilidade
dos produtores renegociarem os seus débitos de crédito rural tanto dos custeios
tomados para financiar a safra 2019/2020, como também em relação às operações
de investimento, e, inclusive, às operações de custeio renegociadas de outras
safras
De acordo com Buss, o produtor rural atingido pela estiagem de verão ainda tem
a possibilidade de renegociar os seus contratos de crédito rural. Nos casos de
contratos de custeio a resolução previu a repactuação para pagamento em até
sete anos. Já nos contratos de investimento, o produtor tem direto de prorrogar
a parcela com vencimento entre primeiro de janeiro e 31 de dezembro de 2020
para o final do contrato, ocorrendo o mesmo para as operações de custeio de
anos anteriores. Buss, porém, faz um alerta que para ter direito a estas
prorrogações é imprescindível a comprovação das perdas através de um laudo
técnico e o encaminhamento formal de um requerimento para a instituição
financeira. “Este pedido deve ser formalizado para que, no caso de negativa por
parte da instituição financeira, o produtor tenha a possibilidade de
buscar judicialmente o seu direito”, pondera
Com relação à última estiagem deste segundo semestre, ainda não existe uma
norma específica do governo federal a fim de minimizar os seus efeitos. Buss
ressalta, no entanto, que há normas que asseguram e protegem o produtor rural
nestas situações. “O manual de Crédito Rural cuja vigência é permanente, já
prevê que no caso de frustrações de safra decorrentes de fatores
adversos, o produtor rural tem o direito de renegociar os contratos de
crédito rural, providenciando o laudo e protocolando o requerimento junto ao
banco de preferência antes do vencimento”, afirma.
Na questão da Nova Lei do Agro publicada em abril deste ano, o advogado entende
como um fator positivo para o setor rural. Esta legislação consiste em
modernizar e trazer novas formas de financiamento para o agronegócio
brasileiro, estimulando, principalmente, investimentos privados e
estrangeiros. “É importante ressaltar que esta legislação não substitui as
normas do Crédito Rural, mas abre novas frentes de financiamento para os
produtores rurais, porém, com algumas peculiaridades. Ela institui, por
exemplo, um novo título de crédito que é a Cédula Imobiliária Rural, no qual
não se aplicam as nomas do Manual de Crédito Rural”, explicou, informando
tratar-se de uma legislação recente e com algumas regulamentações pendentes,
principalmente por parte do Conselho Monetário Nacional.
Segundo Buss, é esperado que a partir de 2021 comecem a ser implementadas na
prática estas novas formas de financiamento e o produtor deve buscar
informações antes de contratá-las. Destaca como positivo o fato de a Lei do
Agro ter uma ferramenta que poderá ser bem utilizada que é o chamado Patrimônio
Rural em Afetação, um mecanismo pelo qual será possível o produtor separar uma
parte do seu imóvel rural a fim de ofertar em garantia em uma Cédula de
Imobiliária Rural ou uma CPR. “A diferença em relação ao Crédito Rural, neste
caso, é que atualmente independentemente do valor do crédito a ser tomado, a
matrícula inteira do imóvel ficará como garantia. Com o Patrimônio Rural em
Afetação, poderá ser feita a separação de parte desse imóvel rural e ofertar
essa fração num valor compatível com o financiamento”, observa Buss, prevendo,
porém, que no próximo ano poderá haver evolução nestes mecanismos da nova lei.
Em sua avaliação do ano em termos de legislação para o setor do agronegócio, o
sócio da HBS Advogados lembra a alteração na Lei da Recuperação Judicial aprovada
pelo Congresso Nacional no final do mês de novembro, que permitirá ao produtor
acessar o instituto da recuperação judicial. Essa legislação que deve ser
sancionada ainda neste ano, passando a vigorar em 2021, vai na mesma linha de
duas decisões do STJ em 2019 e 2020 que admitiram a recuperação judicial por
parte do produtor. A única ressalva feita por Buss é que a recuperação judicial
é um remédio muito drástico e não deve ser utilizado corriqueiramente. “É a
última alternativa não só para o produtor rural mas para qualquer empresário.
Então é uma legislação que terá de ser analisada com muita cautela com
detalhamento econômico e jurídico”, destaca.
O Seguro Rural e o Funrural também foram questões abordadas por Buss nesta
avaliação do ano. Na parte do Seguro Rural lembra que a área protegida dobrou
em relação à 2019 e a expectativa é de que este aumento continue. “Este ano
tivemos 20% da área plantada segurada, mas ainda estamos longe dos países
desenvolvidos como, por exemplo, os Estados Unidos que têm mais de 80% da área
segurada. Temos questões ainda para avançar como o custo do seguro e uma maior
abrangência. Este é um assunto que julgo importante, principalmente, para os
produtores que forem aderir às formas de financiamento da Nova Lei do Agro”, salienta.
Sobre o Funrural, Buss observa que em 2021 deverá ser finalizado o julgamento
no STF que está empatado em cinco a cinco e definirá esta questão em relação à
constitucionalidade ou não para o produtor rural pessoa física. “Temos ainda
uma demanda importante que está também para ser julgada, que é a questão
indígena”, finaliza.