Rafael Pio – Engenheiro agrônomo, doutor e professor adjunto – Universidade Federal de Lavras (UFLA) – rafaelpio@dag.ufla.br
A escolha do local de plantio é tarefa das mais criteriosas, pois dela depende diretamente o sucesso da exploração econômica. Sob o ponto de vista fitotécnico, é recomendável a escolha de áreas que tenham disponibilidade de água.
O uso da irrigação, associado a outras práticas culturais, como a poda de frutificação em épocas distintas, manejo nutricional e emprego de fitoreguladores, permitem a obtenção de frutos fora da época tradicional de colheita, o que pode possibilitar um maior retorno econômico do empreendimento.
Ainda que não se pretenda fazer uso da irrigação, o bom suprimento de água na propriedade torna-se necessário, principalmente quanto ao manejo fitossanitário do figueiral, da mesma maneira que a boa drenagem do solo na profundidade superior a um metro, a textura areno-argilosa e a ausência de nematoides, fatores esses primordiais na escolha do local de cultivo. Também devem ser evitados locais com riscos de geadas frequentes.
A necessidade da instalação de quebra-vento também deve ser avaliada. Ventos fortes podem ocasionar ferimentos nas folhas das figueiras, os quais podem facilitar a incidência de patógenos, além de favorecer a queda prematura de frutos.
Sob o ponto de vista fisiológico, a presença de ventos representa um gasto energético para a planta, pois diminui a fotossíntese e aumenta a transpiração celular. Assim, o plantio de quebra-ventos deve ocorrer concomitante ao plantio das figueiras.
Peculiaridades
Quando se considera o aspecto socioeconômico da exploração das figueiras, alguns aspectos devem ser considerados. O primeiro diz respeito à necessidade de mão de obra especializada. No último levantamento realizado no Estado de São Paulo sobre a estratificação das propriedades que cultivam figo, foi constatado que existe a necessidade, em média, de cinco a sete pessoas para conduzir satisfatoriamente 4.000 plantas (média de 2,21 ha), o que é feito predominantemente pelo sistema familiar ou de parceria/meeiro, no qual, preferencialmente, a família do proprietário ou do meeiro habita a propriedade.
Defina o destino da produção
Outro aspecto importante é o destino final da produção. A única cultivar explorada comercialmente até o momento no Brasil é a ‘Roxo de Valinhos’, que apresenta boa rusticidade e produtividade, além de ampla adaptação aos climas temperados e subtropicais brasileiros.
Contudo, a alta perecibilidade dos frutos, quando colhidos maduros, é o fator mais preocupante do ponto de vista da comercialização da produção. Nesse quesito, o produtor tem que possuir um destino certo para seus frutos.
Não obstante, a cultivar ‘Roxo de Valinhos’ adapta-se muito bem à produção de figos verdes, destinados ao processamento, fabricação de figos em caldas, figadas e geleias. Isso exigirá a presença de unidade processadora nas proximidades, mas permitirá agregação de valor ao produto.
Pesquisas realizadas junto aos consumidores brasileiros revelaram que a compota de figos verdes em calda é a segunda em preferência, perdendo apenas para a de pêssego.
Preparo de solo
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Quando se pretende instalar o pomar em áreas ocupadas anteriormente, por mato ou capoeira, as práticas de preparo do solo envolvem: destoca, subsolagem, retirada de raízes e pedras, aração profunda ou subsolagem e duas a quatro gradagens.
Nessas áreas, se possível, também é recomendável o plantio de uma gramínea anual por um a dois anos previamente ao plantio da figueira. A segunda opção de instalação do pomar é em áreas já cultivadas anteriormente. Nesse caso, as operações de preparo do solo envolvem: subsolagem para romper as camadas compactadas por arações frequentes, aração profunda e duas a quatro gradagens.
Definida a área, a primeira providência é a realização de uma criteriosa amostragem de solo, nas camadas de 0-20 cm e de 20-40 cm, para a determinação das necessidades de correção do solo em ambas as camadas e a necessidade de suplementação nutricional.
Próximo passo
Após o resultado da análise de solo, se detectada a necessidade de calagem, a mesma deve ser efetuada em área total. No Estado de São Paulo, utiliza-se o método da saturação em bases, sendo preconizada a elevação da mesma a 70%.
A dosagem do calcário deve ser dividida em duas aplicações, uma previamente à aração profunda ou subsolagem e a outra previamente à gradagem. Em áreas que apresentam saturação em bases inferior a 20%, recomenda-se que seja feito o plantio e a incorporação de leguminosas com no mínimo um ano de antecedência.
Nessas condições de solos mais fracos, também é recomendável que seja identificada a necessidade de gessagem e de fosfatagem em área total, previamente ao plantio das figueiras. No cultivo de espécies perenes, esses cuidados são fundamentais para o bom desenvolvimento da fruteira, principalmente no caso da figueira, pois os pomares apresentam alta longevidade, superior a 20 anos.
O preparo das linhas de cultivo pode ser feito no sistema convencional, de cultivo mínimo ou plantio direto. O sistema convencional já foi descrito anteriormente para áreas previamente cultivadas ou não.
O sistema de cultivo mínimo é recomendável em áreas mais propensas à erosão. Nesse sistema, o preparo do solo é realizado apenas na linha de plantio, por meio da abertura de sulcos ou covas. As entrelinhas são mantidas roçadas, com ou sem cobertura morta.
Espaçamentos, marcação e preparo das covas ou sulcos
Antes de efetuar a marcação da área, o terreno já deve ter sido avaliado com relação à topografia. Conforme a declividade apresentada, existe necessidade da realização de práticas de controle da erosão, como terraços, cordões de controle e curvas de nível, no sentido contrário à direção das águas. Em áreas com declives, o plantio deve ter orientação para a face norte do terreno, mais iluminada, mais quente e mais preservada dos ventos frios que a face sul.
O dimensionamento dos talhões precisa ser efetuado visando ao melhor aproveitamento da área, a realização dos tratos culturais e colheita. Geralmente, os talhões retangulares são os que permitem a melhor distribuição das plantas na área.
Esse sistema é o mais utilizado atualmente para os terrenos planos ou que apresentam pouca declividade, pois facilita o trânsito interno no pomar, facilitando os tratos culturais mecanizados, como os tratamentos fitossanitários que, nesse sistema, dispensam a interrupção da pulverização entre uma planta e outra, visto que as mesmas se encontram próximas dentro da linha. Também permite um melhor aproveitamento da adubação pelas plantas e torna viável o cultivo intercalar de plantas anuais nos primeiros anos após a implantação do pomar.
Espaçamentos
A marcação das linhas será realizada com a fixação de estacas ou preferencialmente bambus, seguindo o espaçamento adotado. Na escolha do espaçamento, vários aspectos precisam ser considerados. O primeiro deles é o destino da produção dos frutos, ou seja, se os frutos serão colhidos ainda verdes e destinados à industrialização ou se serão colhidos maduros e destinados ao mercado de frutas frescas.
Existem recomendações de espaçamento de 3,0 metros entrelinhas e 3,0 metros entre plantas; 3 m x 2,5 m; 2,5 m x 2,5 m e 3 m x 2 m (densidade de 1.667 plantas/ha), sendo esse último o mais recomendado para a produção de figos de mesa, destinados para o consumo ao natural, cujos frutos pesam, em média, 70 a 90 gramas.
Quando o destino for a industrialização dos frutos, os figos são colhidos verdes, com massa média de 15 a 20 g, e o que se pretende é a obtenção de um número maior de frutos por planta. Nesse caso, o espaçamento pode ser diminuído para 3,0 m x 1,5 m; 3,0 m x 1,0 m e 2,5 m x 1,5 m (densidade de 2.667 plantas/ha), esse último o mais recomendado.
Outros fatores a serem considerados na escolha do espaçamento são a disponibilidade do uso de máquinas e implementos, fertilidade do solo, topografia, o sistema de condução das plantas e os tratos culturais.
Adensamento de plantas
De acordo com dados da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), no Estado de São Paulo, o cultivo da figueira em regiões subtropicais vem sofrendo um processo de adensamento, no qual a densidade oscilou em torno de 1.200 a 1.300 plantas por hectare no levantamento de 1995/96 para 1.600 a 1.700 plantas por hectare em 1998/2003. Esse fato é decorrente da escolha de novos sistemas de condução das plantas.
Alguns produtores têm optado por conduzir as plantas com duas pernadas principais, com vistas, principalmente, à realização de práticas mecanizadas no pomar para o controle fitossanitário.
Os fatores determinantes para o preparo das covas ou sulcos de plantio são: a dimensão dos pomares, a disponibilidade de máquinas, implementos e mão de obra. Em pequenas áreas, normalmente a opção é pela abertura manual das covas.
Com o auxílio de uma enxada, a camada superficial do solo é colocada de um lado da cova e a ela junta-se o calcário e o esterco curtido. A camada subsuperficial é colocada no outro lado da cova, incorporando-se nessa os fertilizantes fosfatados, potássicos e ainda mais esterco curtido. Em seguida, faz-se a inversão das camadas.
No fundo da cova, é colocada a camada superficial, junto com o esterco e o corretivo, todos bem misturados. Depois, completa-se com a camada da subsuperfície misturada com os fertilizantes à base de fósforo, potássio e o esterco. Posteriormente, faz-se a marcação com bambu e as regas.
A abertura das covas também pode ser efetuada com o uso de brocas mecanizadas, nas dimensões de 60 cm de comprimento x 60 cm de largura e 60 cm de profundidade. Porém, em solos argilosos as paredes das covas ficam vitrificadas, dificultando a passagem das raízes.
Nesse caso, é necessário fazer a raspagem das paredes. Já o plantio em sulcos, realizado com o emprego de sulcadores mecânicos, deve ser feito na profundidade de 50 a 60 cm.
Adubação
A adubação fundamental ou de base é aquela feita nas covas ou sulco e deve seguir as recomendações da análise de solo. De maneira geral, existem recomendações básicas que preconizam a aplicação de: 5,0 kg de esterco de galinha ou 15 kg de esterco de curral curtido ou 2,0 kg de torta de mamona mais 100 g de calcário para cada tonelada aplicada por hectare, acrescido de 80 g de P2O5 e 30 g de K2O.
Plantio
O plantio das estacas não enraizadas ou mudas provenientes de estacas enraizadas deve ser realizado sempre após 30 a 60 dias do preparo das covas. Isso porque os corretivos e fertilizantes devem reagir com o solo.
A época de plantio depende do tipo de muda a ser utilizada. Se for empregado material propagativo proveniente de estacas não enraizadas, oriundas da poda de frutificação hibernal e o plantio for realizado diretamente na cova ou sulco, alguns cuidados especiais são necessários.
A estaca deve ter comprimento de 40 a 60 cm e de 2,0 a 4,0 cm de diâmetro. O corte superior deve ser feito acima de uma gema e o inferior abaixo e em bisel. No plantio, a estaca deve ser quase totalmente enterrada na cova, no sentido vertical, ficando acima do solo apenas uma ou duas gemas, sobre as quais deve ser feita uma amontoa, cobrindo totalmente a estaca.
Esse plantio é realizado normalmente nos meses de junho a agosto, pela disponibilidade do material que, na verdade, é o resíduo da poda drástica realizada durante o período de dormência das figueiras. Deve-se optar preferencialmente pela realização do plantio nas horas mais frescas do dia e, se possível, em dias nublados.
Recomendações
Quando são utilizadas mudas provenientes de estacas enraizadas em recipientes, o plantio pode ser feito em outros meses do ano, considerando-se a disponibilidade de água. Pode-se, ainda, preconizar o plantio das mudas entre os meses de junho e julho, desde que seja empregado o uso da irrigação ou pela rega das mudas pós-plantio nas semanas ausentes de precipitações.
Pelo fato de as mudas estarem no período de dormência, as mortes de mudas ocasionadas na operação de plantio são reduzidas, e em alguns casos não se perde nenhuma muda.
Na operação de plantio, as mudas devem ser mantidas na posição vertical. Tomar cuidado para distribuir o sistema radicular dentro da cova. Deve-se eliminar as bolsas de ar, por uma leve compactação do solo e irrigar abundantemente as mudas até o pegamento.
As mudas rebentões ou filhotes que crescem junto ao tronco das figueiras adultas são contraindicadas, pelo perigo da disseminação de nematoides.
Pós-plantio
Os cuidados pós-plantio são o tutoramento das mudas com bambu e a construção de bacias de irrigação ou de retenção de água, realizadas com a enxada, numa distância de 40 a 50 cm do tronco da planta.
Na ficicultura, o uso da cobertura morta entre as linhas de plantio e nas linhas de cultivo é uma prática muito empregada e das mais saudáveis usadas na manutenção do figueiral. Sua colocação, logo após a poda de inverno, proporciona muitos benefícios, como o controle de nematoides, manutenção de umidade do solo e fonte para a ciclagem de nutrientes, levando a uma melhor produtividade.
Para um adequado manejo da água no solo para o cultivo da figueira, recomenda-se o emprego da irrigação em conjunto com a cobertura morta do solo, pois potencializa a produção. Porém, em algumas regiões, pelas condições climáticas de altas temperaturas e umidade, com um período seco bem definido, a formação de cobertura morta torna-se um grande desafio, pelas altas taxas de decomposição e déficit hídrico, no cultivo de plantas específicas para cobertura, durante o período de seca.
Nessas condições, muitas vezes torna-se necessária a aquisição de cobertura morta, tal como bagacilho de cana, maravalha de pinus, entre outros.