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Realidade do manejo de doenças na soja

A utilização de cultivares resistentes a nematoide cisto é capaz de reduzir em 90% o potencial de multiplicação.

Erica Zielinski
Engenheira agrônoma e mestra em Produção Vegetal – Universidade Federal do Paraná (UFPR)
ericacamilazielinski@gmail.com

Lavoura de soja com sintomas de nematoide
Crédito: Ana Maria Diniz

A cultura da soja, ano após ano, tem ganhado importância no cenário nacional. Na safra 2022/23 o Brasil alcançou novamente a posição de maior produtor mundial de soja, com uma produção de 156 milhões de toneladas (USDA, 2023).

Esse aumento na produção está associado à ampliação da área cultivada no país e ao incremento de produtividade por área. Esse último só se tornou possível devido ao grande investimento em pesquisa e emprego de tecnologias, desde o melhoramento genético das cultivares, melhor entendimento das necessidades nutricionais e compreensão de manejos visando controle de pragas e doenças.

Nesse sentido, o máximo desempenho de uma cultivar depende de inúmeras questões associadas ao manejo adotado, visando maximizar a expressão genética daquela cultivar.

Vários exemplos podem ser citados de cultivares com excelentes tetos produtivos, mas que possuem determinadas características de sensibilidade a doenças. Dessa forma, a escolha da cultivar adequada depende dos desafios que o produtor possui na região de cultivo ou no talhão específico.

Atenção!

Para ilustrar, de nada adianta posicionarmos um material com elevado teto produtivo e que tenha suscetibilidade à Phythophtora spp. em um local em que essa doença é um problema conhecido. Assim, antes de posicionar o material é importante analisarmos o talhão e a região para recomendar o material de maneira mais apropriada.

Então, como posicionar o material de maneira correta? Inicialmente, precisamos entender alguns conceitos. Pensando nas diversas doenças que podem acometer a cultura da soja, de acordo com a classificação de McNEW, temos doenças que causam danos em: 1) Órgãos de reserva, 2) Plântulas, 3) Raízes e colo, 4) Murchas vasculares, 5) Manchas foliares e 6) Viroses, galhas e carvões.

Alguns exemplos do ataque em plântulas são os tombamentos causados por Pythium spp. e Rhizoctonia spp., no caso de dano em raízes, ocasionados por Macrophomina spp. e Phythophtora spp., e murchas vasculares ocasionadas por Fusarium spp.

Mancha alvo em soja
Crédito: Andréia Machado

No caso dos nematoides, ocorre dano nas raízes, sendo que o gênero Meloidogyne spp. apresenta ocorrência de galhas. De maneira geral, doenças de solo que acometem as plantas possuem o controle dificultado.

Pensando nas manchas foliares, essas afetam a fotossíntese, como exemplo: ferrugem asiática da soja (Phakopsora pachyrhizi), mancha alvo (Corynespora cassiicola), cercosporiose (Cercospora kikuchii), oídio (Microsphaera difusa) e míldio (Peronospora manshurica).

O que fazer?

Para reduzir as perdas de produtividade, é necessário realizar o controle de maneira adequada. O primeiro método de controle que podemos utilizar para posicionar os materiais de maneira mais assertiva é o controle genético.

Hoje, temos no mercado diversos materiais que apresentam resistência ou tolerância a determinadas doenças, mas, qual a diferença entre resistência e tolerância?

Podemos definir tolerância como a capacidade de uma cultivar em manter seu potencial produtivo mesmo com elevada ocorrência da doença. Ou seja, a doença irá ocorrer numa cultivar tolerante, porém, não teremos danos ou eles serão pequenos.

Um exemplo é a ocorrência de mancha-alvo, em que determinadas cultivares de soja possuem tolerância à doença, e assim, mesmo com severidades elevadas a campo, ocorre baixa perda de produtividade.

A tal resistência

Conceitualmente, resistência é a característica da cultivar que impede ou inibe o desenvolvimento de um patógeno, ou os efeitos que causam danos. Ou seja, uma cultivar resistente vai apresentar redução na ocorrência da doença a campo.

Essa redução é classificada em níveis e, portanto, uma cultivar pode ser altamente resistente, moderadamente resistente ou moderadamente suscetível. Alguns exemplos são as cultivares com resistência a ferrugem asiática da soja, que ocorre pela inserção de genes Rpp, proporcionando resistência do tipo imunidade, que reduz a esporulação e a evolução da doença nas plantas.

Podemos citar também as cultivares de soja com resistência a nematoide de cisto. A planta reage ao ataque do patógeno causando uma reação de hipersensibilidade, na qual a planta irá causar a morte programada de algumas células ao redor do ponto de infecção, fazendo com que o nematoide não consiga se movimentar e se desenvolver, causando morte do patógeno e redução de danos à cultura.

Opções no mercado

Podemos notar que há várias opções disponíveis para o controle genético, como cultivares com resistência ou tolerância à pústula bacteriana (Xanthomonas axonopodis pv. Glycines), crestamento bacteriano (Pseudomonas savastanoi pv. glycinea), mancha “olho-de-rã” (Cercospora sojina), oídio (Microsphaera diffusa), mancha alvo (Corynespora cassiicola), cancro da haste (Diaporthe phaseolorum f. sp. meridionalis), podridão vermelha da raiz (Fusarium solani) e podridão radicular de phytophthora (Phytophthora sojae).

Pensando em nematoides, atualmente temos cultivares com resistência a Meloidogyne spp. e Heterodera glycines. A utilização de cultivares resistentes a cisto, por exemplo, é capaz de reduzir em 90% o potencial de multiplicação de uma raça presente na área, enquanto uma cultivar moderadamente resistente é capaz de reduzir em 70%, quando comparado com cultivares sensíveis.

Na prática, quando uma área de cultivo apresenta um problema conhecido com alguma dessas doenças, utilizar cultivares resistentes facilita o manejo e aumenta as chances de sucesso na lavoura.

Por isso, é importante, a cada ano, entender os problemas que acometem a lavoura, para posteriormente realizar um manejo assertivo na próxima safra. No caso de nematoides e Phytophthora spp., entender quais espécies e raças estão afetando a cultura é imprescindível para a correta escolha das cultivares.

Pesquisas

Em áreas com ocorrência de mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum), a escolha da cultivar é importante, pois a doença é favorecida por condições de elevada umidade e temperaturas amenas.

Cultivares que possuem folhas lanceoladas que permitam melhor aeração e facilitem a aplicação de fungicidas geralmente apresentam menor ocorrência da doença. Por ser uma doença de difícil controle, o correto posicionamento do material é fundamental para que não ocorram perdas de produtividade.

Em estudo realizado com cinco cultivares de soja, a incidência da doença variou de 45 a 95% e a redução na produtividade variou de 147 a 263 kg/ha a cada 10% de severidade em cultivares que possuíam diferentes níveis de tolerância, demonstrando a importância da escolha da cultivar para a produtividade.

E se a cultivar posicionada for sensível ao problema que tenho na área? Essa é uma realidade que pode acontecer em algumas situações, visto que muitas vezes o produtor desconhece o problema que possui na propriedade ou não se atentou a essa informação no momento de adquirir as sementes.

Nessa situação, podemos manejar essas doenças com o auxílio de produtos químicos e biológicos.

Sintomas de mofo-branco em soja
Crédito: Daniel Cassetari

Que manejo adotar?

Doenças de solo causadas por fungos ou nematoides são de difícil controle tendo em vista a dificuldade de atingir o alvo que está no solo. Nos últimos anos, produtos biológicos têm sido empregados devido aos bons resultados que têm alcançado.

Assim, empregar produtos biológicos em cultivares sensíveis é uma prática que tem gerado resultados positivos, com incremento em produtividade. Em áreas com elevada ocorrência de nematoides, tem se utilizado de diversas ferramentas, como manejo genético, químico e biológico.

O manejo químico é capaz de realizar a proteção das raízes no início do desenvolvimento (primeiros 35 – 40 dias). Após essa fase os produtos biológicos possuem atuação, reduzindo a população de nematoides e auxiliando na redução dos danos.

Existem patógenos que possuem estruturas de resistência, como é o caso de S. sclerotiorum e Macrophomina spp., que produzem escleródios e microescleródios. A utilização de microrganismos que sejam capazes de degradar essas estruturas, como é o caso de Trichoderma spp., pode ser uma alternativa no controle dessas doenças.

Em ambos os casos, o Trichoderma spp. no momento do plantio pode ser empregado. No caso de S. Sclerotiorum, em áreas com histórico, a utilização do agente biológico pode ser realizada na dessecação pré-plantio e no estádio fenológico V4, quando as linhas se apresentam abertas, com objetivo de atingir o escleródio no solo.

Para o mofo-branco, além do controle do escleródio, é necessário a utilização de fungicidas no momento da floração para proteção da planta.

Doenças de solo

Para as doenças de solo, vários microrganismos podem ser utilizados entre eles:

Ü Bactérias do gênero Bacillus: algumas espécies desse gênero, como Bacillus subtilis e Bacillus amyloliquefaciens, produzem substâncias antifúngicas que podem inibir o crescimento de patógenos no solo, protegendo as raízes das plantas. Além disso, essas bactérias possuem ação sobre o desenvolvimento das plantas com produção de fito-hormônios.

Ü Fungos antagonistas: certos fungos, como Trichoderma spp. e Pochonia spp., são utilizados como agentes de controle biológico contra patógenos do solo. Eles competem com os patógenos por recursos e podem produzir enzimas que degradam as estruturas dos patógenos, sendo a Pochonia spp., um microrganismo específico para controle de ovos de nematoide.

No campo

O controle químico sempre foi uma alternativa almejada pelos produtores, porém, na cultura da soja, a tecnologia de aplicação e o custo elevado sempre foram problemas para a adoção em larga escala desse método.

Atualmente, temos várias moléculas no mercado, entre as quais: abamectina, tiodicarbe, fluensulfona e fluopiram, que agem na proteção inicial do sistema radicular. Resultados obtidos pela fundação MS (2023) relatam incremento de produtividade variando de 7,0 a 8,0% com a utilização de fluopiram e abamectina, respectivamente.

Essa proteção reduz a penetração dos nematoides no sistema radicular, melhorando o estande e maximizando a produtividade. No entanto, o controle químico sozinho não é capaz de reduzir a população de nematoides de uma área. Dessa forma, o manejo integrado associando plantas de cobertura, controle químico e biológico é a melhor iniciativa.

Soja atacada por míldio
Crédito: Daniel Cassetari

Manejo de doenças foliares

Pensando no aspecto das doenças foliares, a utilização de produtos biológicos em substituição aos multissítios tem sido adicionada ao manejo, especialmente nas primeiras aplicações para o controle de manchas foliares.

De um modo geral, em situações com elevada pressão de determinada doença a escolha de cultivares que apresentem tolerância ou resistência pode facilitar o manejo. Além disso, é importante conhecer os ingredientes ativos com maior eficiência para utilizar no manejo das doenças, posicionando os melhores sítioespecíficos associados a multissítios no momento correto.

Lembrando que, quanto antes iniciarmos a proteção da planta, especialmente para manchas foliares, em que o patógeno fica no solo de uma safra para outra, menores as perdas na cultura.

Assim, o controle de doenças requer conhecimento dos problemas de cada área. Portanto, é necessário realizar um exame cuidadoso e a correta identificação dos agentes patogênicos.

O sucesso no manejo requer o emprego coordenado de genética apropriada, produtos químicos e biológicos, tecnologia e momento ideal de aplicação. São tantas as variáveis que, apesar de ser possível listar linhas de atuação, é indispensável o acompanhamento de um profissional capacitado em cada contexto para otimizar a utilização de recursos e manter ótimas produtividades.

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