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Silvicultura de elite: mogno é madeira nobre do Brasil

O mogno, tesouro da silvicultura brasileira, desponta como símbolo de excelência e sustentabilidade na produção florestal.

Daniela Minini
daniminini16@gmail.com

Cibelle Amaral Reis
cibelleareis@gmail.com

Engenheiras florestais e mestras em Engenharia Florestal – Universidade Federal do Paraná (UFPR)

O gênero Khaya, pertencente à família botânica Meliaceae, possui ampla distribuição no continente africano e as espécies desse gênero apresentam diferentes aplicações, desde a madeira, classificada como uma das mais conhecidas e valiosas do mercado internacional, a usos não madeireiros (produção de sementes) e medicinais (a partir de extrativos, cascas e folhas).

Consórcio com palmeira real, aos 26 meses
Crédito Mudas Nobres

A exportação de madeira de Khaya sp. já é consolidada no mercado, destacando-se como espécies de maior interesse Khaya anthotheca (Welw.) C. DC., Khaya grandifoliola C. DC., Khaya ivorensis A. Chev. e Khaya senegalensis (Desr.) A. Juss., todas popularmente conhecidas como mogno africano.

Dificuldades

Atualmente, existe uma dificuldade crescente na obtenção da madeira de mogno das florestas naturais do continente africano por diversos fatores: excesso de colheita e diminuição da cobertura florestal em razão de exploração contínua há mais de 200 anos, poucos plantios florestais e pouco investimento para fornecimento de material em quantidade e qualidade apreciáveis para atender a demanda do mercado, assim como extração ilegal da madeira e instabilidade política em vários dos países fornecedores.

Além disso, algumas espécies, como K. ivorensis, K. anthotheca e K. grandifoliola estão atualmente listadas como vulneráveis pela IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza), como resultado das fortes pressões historicamente exercidas sob o gênero Khaya sp.

Portanto, a maioria dos esforços de conservação dessa espécie no continente africano tem como principais problemáticas a baixa taxa de regeneração natural após a exploração madeireira, além da baixa densidade de árvores adultas em toda a sua área de distribuição, configurando-se como grandes obstáculos para garantir o suprimento contínuo de madeira de florestas naturais para o mercado consumidor.

Substituição

A partir desta demanda de madeira de Khaya sp. no mercado, surge a necessidade de um substituto aos indivíduos provenientes de florestas naturais. Este fato, portanto, impulsionou estudos sobre a adequação do gênero para plantações em grande escala e a procura por países que se assemelhavam em clima com os locais de ocorrência natural, identificando-se, por exemplo, que as formações florestais do continente africano apresentam características similares ao continente sul-americano, o que indica regiões aptas para o plantio do mogno africano.

Adaptação ao território brasileiro

Os primeiros exemplares de mogno africano foram introduzidos no Brasil na década de 1970 no estado do Pará, região norte do país, a partir de sementes enviadas por governantes da Costa do Marfim para a Embrapa Amazônia.

Este material deu origem aos primeiros plantios experimentais desta espécie no país, pois as árvores dele provenientes começaram a produzir sementes em 1989, permitindo a produção de mudas e subsequentes plantios, principalmente na região norte.

Depois deste marco, a área de plantação de mogno africano se expandiu para outras regiões do Brasil, facilitada pela disponibilidade de lote de sementes das matrizes brasileiras e da produção de mudas de qualidade.

Além destes exemplares, no decorrer das últimas cinco décadas, diversos pesquisadores e viveiristas realizaram visitas técnicas ao continente africano com o objetivo de entender mais sobre a cultura do mogno, sobre as espécies com potencial para implantação no Brasil e também trazer consigo outros materiais genéticos para o país.

Toras de mogno
Crédito: Forest Group

O gênero Khaya tem ampla distribuição por toda a África tropical, desde climas equatoriais úmidos com baixa sazonalidade ou com estações mais definidas, até climas mais secos e tropicais com longos períodos de estiagem.

Portanto, o gênero ocorre naturalmente em diferentes condições edafoclimáticas que, por sua vez, são semelhantes a grande parte do território brasileiro. Ou seja, a aclimatação de Khaya no Brasil é resultado da compatibilidade das características de pluviosidade e temperatura próximas às de ocorrência natural das espécies.

Desta forma, a versatilidade inerente do gênero possibilita o crescimento e desenvolvimento das árvores no Brasil sem maiores dificuldades, pois já estavam adaptadas a condições semelhantes.

Condições favoráveis

O gênero Khaya ocorre naturalmente em um gradiente de pluviosidade entre 560 mm.ano-1 e 3.250 mm.ano-1, sendo, portanto, um ambiente inapto abaixo de 560 mm.ano-1 e acima de 3.250 mm.ano-1, e ótimo entre 1.000 mm.ano-1 e 3.250 mm.ano-1, variando de acordo com a espécie.

Em relação à temperatura, o gradiente é consideravelmente menor, variando entre 21ºC.ano-1 e 29°C.ano-1, sendo esta também a faixa ótima para seu desenvolvimento, estando inapto abaixo de 12,5°C.ano-1 e acima de 29ºC.ano-1.

De acordo com o zoneamento para as espécies de Khaya mais difundidas no Brasil, mais de 60% do território brasileiro possui alta aptidão para a implantação e desenvolvimento do gênero, destacando-se as espécies Khaya ivorensis, K. anthotheca, K. grandifoliola e K. senegalensis.

A restrição de seu plantio se dá por questões hídricas, onde o déficit hídrico da maior parte do território nordestino o torna inapto para a maior parte das espécies (exceto K. senegalensis, que possui maior tolerância), ou por grande volume pluviométrico, como é o caso de parte do território noroeste do Amazonas e extremo norte do Amapá.

Por sua vez, a restrição de temperatura se dá em localidades com mínimas expressivas, como na maior parte da região sul do país.

Outro indicativo do sucesso de Khaya no Brasil é o não registro de perdas significativas da produção por pragas quarentenárias que naturalmente acometem o gênero, o que inviabilizaria o desenvolvimento adequado das florestas.

Na África isto ocorre, por exemplo, em razão do ataque de Hypsipyla robusta (broca de ponteiro). Ademais, não foi registrada a ocorrência de problemas em plantios de Khaya em relação à Hypsipyla grandella, agente que causa grandes perdas financeiras em outras espécies de interesse comercial no Brasil (andiroba, mogno brasileiro e cedro), pois causa baixa bifurcação do fuste, reduzindo drasticamente a porção comercial rentável.

Características da madeira

A madeira de mogno africano tem resistência mecânica e estabilidade dimensional apreciáveis, com densidade média, aspectos visuais agradáveis devido a sua cor (marrom-rosada), textura e desenhos, além de boa trabalhabilidade e adesão da superfície à aplicação de tratamentos.

Além disso, apresenta durabilidade e baixo índice de defeitos e crescimento rápido. O mogno africano se encontra no nicho de mercado que exige madeira padronizada e de alta qualidade, ou seja, que apresenta apelo estético e também baixos índices de defeitos, propriedades físico-mecânicas estáveis e durabilidade.

Este material é amplamente empregado em peças de alto valor agregado para a produção de móveis, peças de design e arquitetura de interiores, laminados, especialmente para painéis e acessórios no interior de carros, marcenaria de forma geral, construção de barcos, instrumentos musicais e nas indústrias de armas e material esportivo.

A aclimatação de Khaya no Brasil é resultado da compatibilidade das características de pluviosidade e temperatura próximas às de ocorrência natural das espécies
Crédito: Adilson Santos

É válido ressaltar que as características e aplicação aqui mencionadas referem-se ao material de florestas naturais e exemplares adultos. A madeira de mogno africano produzida no Brasil ainda não está abastecendo o comércio de madeira sólida de maneira contínua, pois a maioria dos plantios são jovens e ainda não atingiram a idade de corte final (20 anos).

A madeira já comercializada destes plantios brasileiros é proveniente de desbastes seletivos em plantios principalmente da espécie K. grandifoliola com 11, 12 e 14 anos (Figura 1), não apresentando, portanto, características de uma madeira madura, e tem sido empregada na confecção de portas, janelas, lambris, cobogós, móveis de madeira maciça, laminados e faqueados, dentre outros.

Reflorestamento

Estima-se que o território brasileiro tenha mais de 60.000 hectares de mogno africano, tornando nosso país o maior reflorestador do gênero Khaya do mundo. Dados publicados pela Associação Brasileira de Plantadores de Mogno Africano (ABPMA – 2023), Tropical Timber Market Report (ITTO, 2023), indicam que atualmente no Brasil existem cerca de 42.000 hectares plantados de Khaya grandifoliola, cerca de 23.000 hectares plantados de Khaya senegalensis, aproximadamente 800 hectares plantados de Khaya anthotheca e cerca de 500 hectares plantados de Khaya ivorensis.

Essas plantações estão distribuídas por todo o território, ocorrendo em todas as regiões geopolíticas do país, destacando-se os estados de Minas Gerais, Pará, São Paulo, Roraima e Goiás como os detentores dos maiores plantios.

Figura 1. Plantio de mogno africano localizado no Município de São Roque de Minas, MG, com a espécie Khaya grandifoliola – Fazenda Florestas da Canastra

Fonte: as autoras, 2024.

Pesquisa

No Brasil, os principais atores na pesquisa, desenvolvimento e difusão do mogno africano no país são a Embrapa e a Associação Brasileira de Plantadores de Mogno Africano (ABPMA), sendo esta última uma das responsáveis, por meio de associados, pelos plantios de Khaya em território nacional.

A Embrapa é responsável pela difusão de conhecimentos sobre o gênero Khaya por meio de notas e relatórios técnicos, assim como livros, especialmente sobre K. ivorensis e K. senegalensis.

Por meio da Embrapa, foram realizados diversos estudos sobre tecnologia de sementes, desenvolvimento de mudas, doenças e pragas, desenvolvimento em sistemas agroflorestais, de plantios e aspectos silviculturais, assim como o impacto no solo da cultura de mogno africano no Brasil.

Além disso, existem diversas parcerias dos produtores com o meio acadêmico para o estudo e avaliação da qualidade dos povoamentos e também da madeira. Por sua vez, a ABPMA promove a troca de conhecimentos entre produtores e entre estes e o meio acadêmico, além de promover o fortalecimento do gênero no mercado, especialmente pela divulgação nos mais diversos meios (destacando-se aqui o Mahog Project), estimulando também investidores.

Benefícios socioambientais

Os plantios florestais de mogno africano contribuem para o aumento da cobertura florestal, comumente sendo implantados em locais de solo descoberto, modificando o uso e cobertura do solo em áreas comumente antes improdutivas.

Após o estabelecimento do plantio, há uma melhora das condições do solo, como a deposição de serapilheira e aumento da matéria orgânica, proteção e redução do escoamento superficial de água e consequente percolação da água e nutrientes de forma mais eficiente para as camadas mais profundas do solo.

Além desses processos naturais que envolvem o desenvolvimento do plantio, as árvores já desempenham a função de sequestro (desde sua implantação) e estoque de carbono durante a rotação de 20 anos em todas as suas partes estruturais.

A introdução de plantios de mogno africano e a inserção da sua madeira no mercado também traz como benefício a redução da pressão em espécies nativas em situação de vulnerabilidade, ameaçadas de extinção ou proibidas de corte, como é o caso do mogno brasileiro no Brasil.

Além disso, em diversos países africanos o mogno está se tornando escasso devido à diminuição da cobertura florestal, com considerável redução de exemplares nativos e/ ou até mesmo levando à proibição de corte.

Portanto, o cultivo de espécies alternativas às tradicionais e nativas contribui potencialmente para a redução do avanço do desmatamento e da extração desregrada ou ilegal das espécies para atender à demanda de madeira de maneira contínua para o mercado interno e externo.

Genética

Por causa do interesse ainda crescente na cultura do mogno africano, existe a inserção de material genético proveniente de diversas partes do continente africano para a seleção de material genético que melhor se adapta às condições climáticas do Brasil e que, ao mesmo tempo, tenha produção de madeira com qualidade.

Por fim, como o Brasil é o país com maior plantio florestal de Khaya a nível mundial, é também um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento tecnológico e produção de conhecimento dessas espécies, sendo um dos principais atores no mundo e especialmente fora do continente africano a contribuir ativamente para a preservação deste gênero.

Portanto, o interesse no desenvolvimento da silvicultura do mogno africano contribui para a coleta, estudo e catalogação de maneira aprofundada de diversas espécies e preservação e difusão de materiais genéticos.

Ademais, o interesse econômico também impulsiona estudos para seleção e melhoramento genético, assim como o desenvolvimento de técnicas de viveiro e propagação, práticas de manejo e colheita.

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