Linhagens selecionadas no âmbito do programa de melhoramento genético de tomateiro da Embrapa Hortaliças (Brasília, DF) serão avaliadas quanto ao desempenho produtivo no cultivo em ambiente controlado e fechado, isto é, em sistemas de agricultura indoor do tipo fazenda vertical.
A pesquisa é fruto de um contrato de cooperação técnica entre a Unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a empresa 100% Livre, que opera uma fazenda vertical no centro da cidade de São Paulo com foco no comércio varejista de hortifrútis.
Além da analisar o potencial produtivo, os experimentos devem comprovar a adaptação das linhagens ao sistema de produção indoor, bem como a viabilidade econômica da produção de tomate em fazendas verticais.
Os ensaios experimentais serão realizados em condições de ambiente protegido indoor, com uso de hidroponia e iluminação artificial, em uma unidade de observação instalada na fazenda vertical da empresa localizada em São Paulo.
A expectativa da equipe do projeto é que, ao final dos estudos, com duração estimada de 12 meses, seja possível planejar o desenvolvimento de uma variedade de tomateiro específica para o plantio em fazendas verticais.
Foco
O pesquisador Leonardo Boiteux explica que o objetivo principal é identificar materiais mais produtivos e de melhor qualidade, considerando as peculiaridades do cultivo em um ambiente controlado. “Como a fazenda vertical é um sistema hermético, permitindo isolar de maneira efetiva a entrada de doenças e pragas, não há necessidade de se preocupar em desenvolver variedades resistentes, como seria caso o cultivo fosse em campo aberto. Nesse cenário, o foco tem sido incorporar genes relacionados a aspectos de qualidade do fruto, como coloração intensa, textura adequada, durabilidade pós-colheita e melhor equilíbrio entre ácidos e açúcares, para obtermos um fruto bem saboroso”, assinala.
A arquitetura da planta é outro fator importante, visto que o cultivo em camadas ou andares, como ocorre em fazendas verticais, inviabiliza o cultivo de variedades de tomate de porte convencional e com hábito de crescimento indeterminado.
Por isso, as linhagens que serão analisadas no âmbito do projeto possuem um porte compacto, com crescimento determinado e entrenós curtos, que significa um espaço pequeno entre as folhas da planta e os cachos com frutos. “Buscamos a combinação de dois genes que condicionam um porte mais compacto da planta, com uma arquitetura similar a um buquê de flores, ao ciclo curto de produção”, ressalta o pesquisador.
Ciclo produtivo
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O ciclo de produção do tomate plantado em campo aberto, do plantio até a colheita, varia entre 90 e 100 dias. As linhagens que serão testadas em condições de fazenda vertical apresentam um ciclo de produção de 60 dias e, de acordo com o pesquisador, a proposta é desenvolver cultivares ainda mais precoces. “Conseguir múltiplos ciclos por ano é importante para otimizar a estrutura da fazenda vertical e tornar o cultivo do tomateiro economicamente viável dentro desse sistema de produção”, pondera Boiteux.
O empresário Diego Gomes, que lidera o empreendimento da 100% Livre, comenta que, em tese, nem tudo que apresenta bons resultados no campo ou na hidroponia convencional funciona de maneira adequada nas condições da fazenda vertical.
“No caso das cultivares convencionais de tomate, por exemplo, a produtividade apresentou bons parâmetros, mas a dificuldade com o manejo das plantas não favoreceu a adoção dessas cultivares em um ambiente de cultivo protegido e vertical”, observa. Ele ainda acrescenta que as linhagens de tomateiro da Embrapa previstas para os ensaios experimentais são muito promissoras em termos de arquitetura da planta, produtividade e qualidade do fruto.
Modelos para produção indoor
A Embrapa e a 100% Livre já vêm atuando em parceria há cerca de dois anos para desenvolver modelos para produção de hortaliças em fazendas verticais. Na primeira etapa da pesquisa, liderada pelo pesquisador Ítalo Guedes, foram elaborados sistemas de produção para diferentes espécies de hortaliças, mas com maior foco em folhosas, como alface e rúcula; e hortaliças condimentares, como manjericão, coentro e salsa.
Do ponto de vista do mercado, a escolha das espécies cultivadas é uma etapa importante da pesquisa científica, pois hortaliças com alto valor agregado e ciclo de produção mais curto, com várias safras ao ano, garantem a viabilidade econômica do empreendimento.
“Com o bom desempenho do cultivo de espécies folhosas, constatamos junto aos consumidores uma oportunidade de ampliar nossa variedade de produtos. Diante disso, o tomate é um fruto de alto valor agregado, daí o interesse em uma parceria com a Embrapa para obter cultivares específicas para cultivo em fazenda vertical”, aponta Gomes, que também vem testando o plantio de outras espécies lucrativas, como morango, uva, pimentão, pitaia e avocado.
Novos métodos podem ajudar a alimentar o mundo
Fabrício Custódio de Moura Gonçalves – Doutor em Agronomia/Horticultura – UNESP/FCA, Botucatu – fabricio-moura-07@hotmail.com
A Organização das Nações Unidas (ONU) aponta que a população mundial deve aumentar em três bilhões de pessoas até 2050, chegando a dez bilhões de habitantes, e a maioria dos habitantes do planeta deverá viver em áreas urbanas.
Isso quer dizer que teremos menos mão de obra no campo e as cidades terão que desenvolver as próprias soluções para a demanda por alimentos. Além desse aumento populacional, escassez de áreas cultiváveis, aquecimento global, perdas na pré e pós-colheita e excessivo uso de defensivos agrícolas são preocupações constantes para a segurança alimentar global.
Nesse cenário, as fazendas verticais se tornam excelentes alternativas, principalmente por ampliar a produção agrícola e adaptar a agricultura em grandes centros urbanos, podendo ser projetadas até mesmo nos prédios urbanos e de forma sustentável.
Além disso, como o projeto é todo controlado, pode ser aplicado em qualquer região do planeta, levando alimento para locais isolados ou com pouco potencial agrícola, como regiões de clima semiárido do Brasil.
A evolução do melhoramento
Linhagens selecionadas de tomateiro no âmbito do programa de melhoramento genético de tomateiro da Embrapa Hortaliças estão sendo avaliadas quanto à adaptação e desempenho produtivo em condição de ambiente controlado e fechado, isto é, em sistemas de agricultura indoor do tipo fazenda vertical, tendo em vista a viabilidade econômica da produção de tomate em fazendas verticais.
A produção de tomate em fazendas urbanas é uma oportunidade para evitar ventos, granizo, chuvas e pragas que causam danos a essa cultura. No entanto, são plantas que precisam de espaço, um desafio que precisa ser superado no plantio vertical.
Para impulsionar o cultivo dessa cultura em fazenda vertical, estudos têm utilizado o sistema CRISPR, ferramenta essencial capaz de produzir cultivares adaptadas a diferentes condições ambientais. Essa técnica permite modificar genes de forma precisa, acelerando o processo de melhoramento genético, ou seja, produzindo cultivares em um menor espaço de tempo.
Plantas de tomate modificadas com a técnica CRISPR revelam que a alteração de três genes resulta em plantas de tomate compactas e com desenvolvimento de frutos em menor tempo (produção precoce). Dentre as variedades de tomate editadas, a que demonstrou os resultados mais interessantes foi a do tomate cereja “Sweet100”.
Essa técnica CRISPR permite a obtenção rápida de culturas de frutos com os parâmetros agronômicos mais desafiadores da agricultura urbana: ciclagem rápida e tamanho compacto da planta. Portanto, obter variedades com estas características oportuniza a agricultura urbana, fornecendo com maior rapidez e sustentabilidade diferentes alimentos para a população urbana.
Como implantar a técnica?
As fazendas verticais são estruturas localizadas sobretudo nos grandes centros urbanos, destinadas ao plantio de vegetais em camadas verticais. A produção agrícola vertical utiliza meios tecnológicos para a sobreposição de produção na mesma área, ou seja, a produção é intensificada devido ao aproveitamento do espaço aéreo sobre o solo, sendo o cultivo em bandejas empilhadas até o teto para maximizar a área cultivada, podendo ser de poucos ou vários andares.
A parte estrutural desse tipo de cultivo consiste em utilizar instalações automatizadas, em uma versão que pode chegar a até 30 andares e gerar o menor impacto ambiental possível, criando uma alternativa no processo de abastecimento alimentar às populações do meio urbano.
Entre as ferramentas modernas utilizadas como aliadas para o aumento da produtividade estão a eliminação do uso de agrotóxico, o monitoramento por parte dos produtores de todas as safras por meio de sistemas de Inteligência Artificial, as luzes de LED, azul e rosa, que simulam a luz do sol e aceleram a fotossíntese.
O sistema hidropônico adotado é composto por um sistema de irrigação com tanques, encanamento, bombas de alta pressão e filtros de água, localizadas abaixo de cada bandeja e entre as plataformas. Além disso, é imprescindível que haja sensores de corrente elétrica e de pH para medir a concentração dos nutrientes diariamente.
Colocando em prática
O ciclo de produção do tomate plantado em campo aberto, do plantio até a colheita, varia entre 90 e 100 dias. As linhagens testadas em condições de fazenda vertical apresentam um ciclo de produção de 60 dias, e a proposta é desenvolver cultivares ainda mais precoces.
Conseguir múltiplos ciclos por ano é importante para otimizar a estrutura da fazenda vertical e tornar o cultivo do tomateiro economicamente viável dentro desse sistema de produção.
No caso das cultivares convencionais de tomate, por exemplo, a produtividade apresenta bons parâmetros, mas a dificuldade no manejo das plantas não favorece a adoção dessas cultivares em um ambiente de cultivo protegido e vertical.
No caso das linhagens de tomateiro da Embrapa previstas para os ensaios experimentais, são muito promissoras em termos de arquitetura da planta, produtividade e qualidade do fruto.
Dessa forma, a arquitetura da planta é um fator importante, visto que o cultivo em camadas ou andares, como ocorre em fazendas verticais, inviabiliza o cultivo de variedades de tomate de porte convencional e com hábito de crescimento indeterminado. Por isso, as linhagens analisadas devem possuir um porte compacto, com crescimento determinado e entrenós curtos, que significa um espaço pequeno entre as folhas da planta e os cachos com frutos.
As fazendas verticais têm potencial de produzir muitos tipos de vegetais, recuperam um alto potencial da água utilizada, sendo superior ao sistema de hidroponia em ambiente aberto e a agricultura tradicional. Resultados de experimentos científicos na Holanda, utilizando ambiente controlado com tomate, alcançaram produtividades equivalentes a mil toneladas por hectare.
Obtido a partir da técnica CRISPR, a variedade Sweet100 com os três genes editados teve seu desempenho avaliado em campo aberto e em condições de fazendas urbanas. O resultado mostrou um bom desempenho, produzindo seus primeiros frutos maduros em até 40 dias.
Embora tenha apresentado frutos reduzidos e em menor número em relação à não editada geneticamente, seu menor tamanho permite o cultivo de mais plantas por área, mantendo a produtividade em um espaço de crescimento limitado.
Sem erros
Em condição de plantio em fazenda vertical as plantas apresentam um desenvolvimento mais acelerado e precoce dentro do contêiner, em um ambiente interno totalmente controlado. A precocidade é desejável porque impacta na otimização da produtividade dos cultivos.
Contudo, o desenvolvimento mais acelerado das plantas no ambiente indoor pode resultar em sintomas de deficiência de nutrientes, como cálcio e boro, que ocasionam queimaduras na borda das folhas.
Dessa forma, o desafio é ajustar a oferta de nutrientes para a planta, seja aumentando a concentração na solução nutritiva ou reduzindo a periodicidade dos fluxos da fertirrigação, ou seja, é preciso alimentar as plantas no tempo exato e na quantidade correta para maximizar a produção.
Ademais, o crescimento mais acelerado das plantas, quando comparado ao cultivo em campo aberto, acontece por causa da intensidade luminosa do ambiente controlado. Dessa forma, é importante modular os espectros de luz para indução de precocidade nas plantas, mas esse ajuste deve considerar que os nutrientes e demais fatores de produção devem estar também em equilíbrio para que se tenha a máxima eficiência produtiva.
Para o cultivo de tomates em ambiente fechado, é preciso que a planta receba entre quatro a cinco horas de sol por dia e seja regada com frequência para que dê muitos frutos.
Além da água, da luz e dos nutrientes, entre os ingredientes essenciais para o desenvolvimento das hortaliças está o gás carbônico (CO2), uma substância primordial para a realização da fotossíntese pelas plantas.
Em um ambiente fechado, em que a substituição do volume de ar é lenta ou parcial, os níveis de CO2 podem cair rapidamente e limitar a fotossíntese e a produção de alimentos. Por isso, a modelagem de um sistema de produção para hortaliças em ambiente controlado deve considerar o fornecimento e a concentração de CO2 na atmosfera interna para as plantas se desenvolverem bem.
Investimento x retorno
As fazendas verticais apresentam soluções econômicas e ambientais muito interessantes, no entanto, o custo de sua implementação ainda é elevado e necessita de financiamento expressivo para ganhar escala, logo, no curto e médio prazo é pouco provável que o mercado global se depare com empresas dotadas de força produtiva a ponto de deslocar a riqueza do sistema tradicional para a agricultura indoor.
Já no longo prazo é possível vislumbrar a disseminação das fazendas verticais pelo mundo, alavancadas pela necessidade do aumento da capacidade produtiva em função do crescimento populacional. No entanto, antes de sua implantação, é importante realizar estudos de mercado e verificar se há consumidor disposto a pagar mais por um produto diferenciado.
Um aspecto a ser destacado nas fazendas verticais totalmente fechadas é o alto consumo de energia com o uso de iluminação a LEDs, o que, às vezes, inviabiliza a sua implantação, além da necessidade de mão de obra qualificada.
Apesar disso, no processo de investimento de fazendas verticais, as despesas gerais de produção são mantidas mínimas, pelo baixo uso de água, custo reduzido de lavagem, de processamento e de transporte das culturas, podendo chegar a 30% do custo de uma fazenda tradicional.
Ademais, sendo independente das condições externas, as fazendas verticais podem fornecer ciclos de colheita mais rápidos (proporcionado pelo controle da temperatura, umidade, luz, etc.) e mais rotatividade de culturas por ano do que a agricultura tradicional, conseguindo cumprir os cronogramas de entrega e contratos de fornecimento.
Esse sistema permite o dobro ou até o triplo de desempenho em comparação à agricultura tradicional. A utilização de variedades e híbridos adaptados de forma específica para esse tipo de ambiente e o manejo adequado dos cultivos podem aumentar ainda mais essa proporção.
Resolução agrícola
Os maiores defensores da agricultura vertical costumam afirmar que esse sistema de produção irá revolucionar a produção global de alimentos, pois reduziriam custos logísticos e iriam garantir, devido à proximidade do mercado de consumo, mais frescor e qualidade aos alimentos. Integração de tecnologias renováveis (painéis solares, turbinas eólicas e sistemas de captura de água podem reduzir gastos da produção vertical.
É obvio que a solução das fazendas verticais pode atender as preocupações alimentares de uma população em crescimento, diante da maior incidência de eventos climáticos extremos, da pressão urbana por terras agricultáveis, da preocupação com a diminuição de perdas no transporte de alimentos (pós-colheita) e da pressão ambiental por uma agricultura mais eficiente no uso de insumos, mais produtiva e menos dependente do uso de terra.
Enfim, esta é uma tecnologia recente que ainda carece de muitas pesquisas. E, nesse cenário futurístico, mas não tão distante, é razoável pensar que a tecnologia dessas fazendas verticais será extremamente otimizada, a ponto de gerar empresas eficientes, produtivas e com alcance global.