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Controle biológico favorece produção de cafés especiais

O controle biológico tem se mostrado imprescindível já que os consumidores estão cada vez mais exigentes.

Guilherme Barbieri França
barbierifaculdade@gmail.com
Endrik Jhonatan dos Santos Miranda
endrikmiranda.agro@gmail.com
Graduandos em Agronomia – Centro Universitário de Ourinhos (Unifio)
Adilson Pimentel Júnior
Engenheiro agrônomo, doutor em Agronomia e professor – Unifio
adilson_pimentel@outlook.com

O uso do controle biológico para manejo de pragas e doenças na cafeicultura tem crescido nas últimas safras, principalmente por produtores de cafés especiais e certificados. Com a utilização de insumos biológicos, a planta responde positivamente, de forma natural e equilibrada, concentrando seu gasto energético na produção de grãos perfeitos.

Demanda

Atualmente, os consumidores estão cada vez mais exigentes quando se trata daquilo que estão bebendo ou comendo no seu dia-a-dia, buscam uma qualidade alimentar melhor, por meio de produtos mais saudáveis, que não prejudiquem a saúde e o meio ambiente.
Deste modo, ressaltamos a importância do controle biológico, que evita o uso dos defensivos agrícolas químicos, muito utilizados na produção de todas as culturas comerciais, inclusive o café.
Além deste benefício, o controle biológico vem ganhando espaço devido à ocorrência de resistência das pragas e doenças aos defensivos químicos utilizados convencionalmente. A técnica evita a eliminação conjunta de inimigos naturais das pragas e doenças presentes na lavoura, e pode diminuir os custos de produção, pois evita o uso excessivo de defensivos agrícolas.

Etapas de produção do café especial

Quando falamos de café especial, o produtor deve conduzir todo o processo, desde uma colheita selecionada, separar os frutos defeituosos, fazer a secagem mais rigorosa, normalmente em terreiros suspensos, até a torra ideal, para total aproveitamento da qualidade da bebida.
Além destes processos, está sendo muito utilizada na produção de cafés especiais a fermentação controlada, que nada mais é do que a degradação de açúcares presentes nos frutos que podem intensificar as qualidades organolépticas dos mesmos submetidos a este processo.
Este pode ser realizado, também, com a inserção de microrganismos como leveduras e bactérias junto aos frutos no recipiente de fermentação. Podemos dizer que a utilização de produtos biológicos durante todo o ciclo cafeeiro pode fazer com que a planta responda de forma natural e melhor a este processo, pois não apresenta resquícios de produtos químicos.

Créditos: Shutterstock

Fitossanidade

Dentre as pragas que estão presentes durante todo o ciclo do cafeeiro, temos algumas de maior importância, por terem alta capacidade de causar danos econômicos à cultura:
Broca-do-café – Hypothenemus hampei (Coleoptera: Scolitidae): a broca-do-café é uma praga altamente prejudicial e pode atacar os frutos em qualquer estádio de maturação. As fêmeas perfuram a região da coroa após acasalarem e colocam os ovos em câmaras feitas nos frutos.
Após eclodirem, nascem as larvas que se alimentam dos grãos, reduzindo o peso e, consequentemente, diminuindo a qualidade, pois passa a ser um grão defeituoso, interferindo na classificação deste café.
Além dos danos causados pela broca, os orifícios podem facilitar a entrada de patógenos. O grande destaque no controle biológico da broca é a utilização da Beauveria bassiana, um fungo que vai penetrar nos insetos por contato, onde irá germinar sobre o tegumento do inseto, atravessando a cutícula e penetrando na cavidade geral do corpo. Em seguida, uma grande produção de conídios leva o inseto à morte.
Bicho-mineiro – Leucoptera coffeella (Lepidoptera: Lyonetiidae): é uma das principais pragas do café, com alto potencial de infestação e, consequentemente, danos à lavoura. Quando não controlada, apresenta alta desfolha no cafeeiro, diminuindo drasticamente a produtividade.
Possui hábitos noturnos e ovipositam na face superior foliar. Após a eclosão, as larvas penetram no interior da folha e começam a se alimentar, criando pequenas câmaras que chamamos de minas. O controle biológico pode ser aplicado com a utilização de inimigos naturais.
Tem sido estudada a utilização de predadores da família Chrysopidae (ordem: Neuroptera), que tem alto potencial para controle do bicho-mineiro. As larvas dos crisopídeos são predadoras vorazes, que possuem resistência a inseticidas, têm alto potencial reprodutivo e podem se alimentar de vários artrópodes de corpo mole.
Por terem ampla diversidade de presas, esses predadores se tornaram uma grande ferramenta para o controle biológico. A liberação dos crisopídeos no campo é feita após a eclosão dos ovos, quando estão no segundo instar, e já têm uma maior aptidão de competição com o alvo.
Cigarra do cafeeiro – Quesada gigas: as fêmeas adultas depositam seus ovos nos ramos do café e, após a eclosão, seguem para a fase de ninfa móvel, que desce até o solo por um filamento produzido pela ninfa em direção à raiz do cafeeiro e inicia sua alimentação da seiva.
Devido a isso, pode acarretar em prejuízos ao aproveitamento de água e nutrientes, podendo resultar em morte das raízes, prejudicar a granação dos frutos, diminuir a vida útil das lavouras e, consequentemente, com queda na produtividade.
No controle biológico pode ser usado o fungo Massospora spp. Esse fungo possui esporos de resistência chamados zigósporos, que têm uma superfície reticulada, formada a partir de hifas no abdome da cigarra. Este fungo vai causar o que chamamos de gangrena seca.
Nematoides – dois principais gêneros Meloidogyne sp. e Pratylenchus sp.: os nematoides atacam as raízes do cafeeiro, causando necroses e até rachaduras, e podem acabar destruindo o sistema radicular da planta, dificultando a absorção de água e nutrientes. As plantas começam a ficar menos vigorosas, com folhas cloróticas, tamanho desigual, manchas em reboleira na lavoura, ocorrendo diminuição na produção.
Para o controle biológico, temos diversos microrganismos, como fungos e bactérias. Porém, os mais utilizados são as bactérias do gênero Bacillus, que apresentam ótimos resultados no controle dos nematoides.
Estes não parasitam diretamente os nematoides, porém, agem produzindo substâncias antibióticas, matando os ovos e/ou os nematoides. Também podem agir criando uma barreira física, quando colonizam a raiz da planta, impedindo a entrada do patógeno.
Em algumas situações, as bactérias criam substâncias que vão mimetizar a região e dificultar que a raiz seja encontrada.
Ácaro da mancha anular – Brevipalpus phoenicis: também conhecido como ácaro da leprose, é o vetor responsável pela transmissão da doença virótica mancha anular do cafeeiro (Coffee ringspot vírus). Os danos causados pelo ataque são concentrados nos frutos, nos ramos e nas folhas. As lesões nos frutos mostram manchas cloróticas, salientes e irregulares, sendo mais evidentes nos frutos já amadurecidos.
Porém, também pode ocorrer em frutos verdes, o que acaba ocasionando a queda dos mesmos e gerando perdas ao produtor. Nas folhas e ramos do café surgem manchas de coloração marrom e halo amarelo, em formato anelar.
Para o controle biológico destes, podemos utilizar ácaros predadores das espécies Euseius alatus e Amblyseius herbicolus, que predam o ácaro-alvo nas fases de larva, ovo e ninfa. Estas duas espécies apresentam grande capacidade de predação desta praga, se tornando de grande importância para a cafeicultura.
Cochonilhas: no cafeeiro, temos a presença de várias espécies de cochonilhas, mas entre as principais temos a cochonilha-da-raiz (Dysmicoccus cryptus), cochonilha-de-placa (Orthezia praelonga), cochonilha-da-roseta (Planococcus citri ou Planococcus minor).
Estas espécies atacam de forma diferente o cafeeiro, causando danos diretos e indiretos, pois além de danificar a planta com a sucção da seiva elaborada, a cochonilha libera uma substância açucarada, que é um atrativo para as formigas doceiras que, no caso de cochonilhas que se abrigam no solo, acabam sendo protegidas pela terra das formigas que agem em simbiose.
Também, essa substância açucarada é atrativa para os fungos do gênero Capnodium spp., conhecidos por causarem o que chamamos de fumagina, que tem uma coloração escura que recobre o limbo foliar, diminuindo a atividade fotossintética e prejudicando o desenvolvimento da planta.
Para o controle biológico, podemos utilizar de fungos como Lecanicillium lecani e o Beauveria bassiana, alguns insetos, como os crisopídeos, que chamamos de bicho-lixeiro e joaninhas (Azya luteipes). Também veem sendo utilizados nematoides entomopatogênicos para controle da cochonilha-da-raiz.

Controle biológico tem apresentado excelentes resultados em café
Crédito: Madelaine Venzon

Contra doenças

Além de pragas, o controle biológico também pode ser utilizado no controle de doenças importantes no cafeeiro, dentre as quais:
Ferrugem do cafeeiro (Hemileia vastatrix): tem como agente causal um fungo. Seus sintomas são bem evidentes, com manchas amareladas translúcidas na face superior da folha e na parte inferior são formados esporos alaranjados, com um aspecto pulverulento.
Esta doença vai provocar queda precoce das folhas e até secagem dos ramos, prejudicando a planta e podendo causar diminuição de até 50% na produtividade. Nesta doença já vem sendo comprovado o uso da bactéria Bacillus subtilis, que vai agir de forma antagônica no patógeno, liberando substâncias tóxicas que vão competir com ele.
Mesmo não sendo tão eficiente como os produtos químicos, é uma forma de minimizar o uso destes agrotóxicos.
Cercosporiose (Cercospora coffeicola): também conhecida como mancha de olho pardo, é uma doença fúngica que pode atacar as folhas e frutos do cafeeiro. Nas folhas os sintomas são manchas circulares de coloração marrom claro a escuro.
O centro das lesões se torna cinza claro, envolvido por um halo amarelado. Já nos frutos, ocorrem lesões necróticas de coloração marrom escuro a negra. As folhas atingidas caem rapidamente, causando assim uma diminuição na taxa fotossintética da planta e, no caso dos frutos, pode causar uma queda precoce, maturação acelerada e aumentar a quantidade de grãos chochos, diminuindo a qualidade dos frutos e, consequentemente, da bebida em si.
Para o controle, além de fungicidas, alguns testes foram realizados com o uso de extrato etanólico de própolis. Por ter comprovadamente ação antifúngica, pode combater o agente causal da cercosporiose. Além dessa propriedade química, a aplicação dessa substância vai formar um filme no limbo foliar que dificulta a penetração do patógeno na planta.
Mancha de Phoma (Phoma spp.): doença causada por um fungo que pode atacar as folhas, flores e frutos novos. Nas folhas, observam-se manchas irregulares escuras, que se iniciam nas bordas e, com o seu desenvolvimento, apresentam aspecto enrugado e, posteriormente, necrose.
Quando infecta os ramos, pode ocasionar murcha e o mesmo pode secar totalmente. Consequentemente, devido à morte, pode causar um brotamento excessivo dos ramos laterais. As flores e frutos atacados podem, posteriormente, sofrer abortamento.
Alguns produtos de origem biológica à base de bactérias Paenabacyllus lentimorbus e Bacyllus subtillis se mostram eficientes no controle desta doença, podendo ser uma boa opção para uso do cafeicultor.
Mancha aureolada (Pseudomonas seringae pv. garcae): esta é uma doença bacteriana que pode atacar as folhas, ramos, flores e frutos. Nas folhas, temos manchas com formato irregular de cor pardo-escura, envolvidas por halo amarelo, que são distribuídas em todo o limbo foliar, porém, são mais frequentes nas bordas.
Pode causar a seca dos ramos produtivos e abortamento de flores e frutos. Nesta doença, também podemos utilizar produtos de origem biológica à base de bactérias Paenabacyllus lentimorbus e Bacyllus subtillis.

Obstáculos

A inserção do controle biológico ainda tem uma certa resistência dos produtores, devidos às suas desvantagens em comparação ao uso dos defensivos químicos. Por exemplo, o controle biológico requer um planejamento e um conhecimento da biologia, tanto das pragas quanto dos inimigos naturais.
É um tipo de controle que requer mais paciência e muito cuidado devido à sensibilidade dos inimigos naturais aos pesticidas comumente utilizados. No manejo biológico não se tem um controle drástico e rápido, como no uso de pesticidas, que tem ação rápida e eficiente, além de ter um grande espectro, atingindo vários alvos, diferente do biológico, que normalmente é mais seletivo.
Com o monitoramento ideal e o uso correto dos inimigos naturais, com o tempo o ecossistema da lavoura pode ser restaurado e a população desses agentes naturais pode controlar as pragas, deixando a lavoura em nível de equilíbrio por um tempo prolongado, diminuindo as intervenções e o custo com estas operações.
Com o menor uso de pesticidas, as pragas ficam menos resistentes, o que acaba criando um controle mais fácil delas.

Eficácia

O uso de defensivos agrícolas químicos, quando feito de forma correta, respeitando as doses, controla as pragas e doenças que poderiam causar algum dano à lavoura, assim garantindo alta produtividade.
Além disso, os alimentos produzidos com o uso deles normalmente tem uma aparência melhor do que os produtos orgânicos. Porém, os produtos orgânicos têm um valor agregado maior para o produtor.
O controle de pragas e doenças estão entre as atividades mais realizadas durante a condução da lavoura, e têm um custo elevado. Por isso, o produtor deve conhecer dos métodos de controle e realizá-los da forma mais sustentável possível.

MIP

Sabemos a importância de preservar o meio-ambiente e a saúde, por isso, é de suma importância adotarmos ferramentas que auxiliem o produtor, para que ele consiga realizar suas atividades, tendo uma boa produção, com qualidade e possa entregar um produto seguro para o mercado consumidor.
Por isso, destaco o manejo integrado de pragas (MIP) e o manejo integrado de doenças (MID), que visam combater de todas as formas possíveis as pragas e doenças presentes nas lavouras.
Nestes, buscamos manter o equilíbrio entre pragas e inimigos naturais e a incidência de pragas e doenças abaixo do que chamamos de nível de dano econômico, ou seja, vamos monitorar para que a tomada de decisão seja feita na hora certa e somente quando necessário, evitando desperdícios.
Estes programas também englobam medidas essenciais, como as áreas de refúgio, armadilhas para controle de pragas, rotação de cultura, uso de cultivares tolerantes ou resistentes, agentes biológicos de controle (inimigos naturais, produtos biológicos), plantio em época adequada, evitando que os períodos críticos para a produção coincidam com as condições favoráveis à multiplicação das pragas e doenças, realizar adubação correta, população adequada de plantas, controle correto de plantas daninhas, etc.
Utilizando esse conjunto de ferramentas, conseguiremos diminuir a dependência do uso de pesticidas e teremos uma produção mais sustentável a cada dia.

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