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Cultivo orgânico de hortaliças em estufa

O cultivo em estufas surgiu como alternativa para viabilizar a produção de alimentos em regiões e épocas do ano nas quais o cultivo a campo era inviável devido às baixas temperaturas.

Cláudia Lopes Prins
PhD em Nutrição Mineral e professora –Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF)
prins@uenf.br

A denominação de estufa indica a principal característica dessa estrutura, que é a retenção de calor. A cobertura com um material que permite a entrada de comprimentos de onda curtos e impede a saída de comprimento de ondas longos resulta no aquecimento interno e torna possível o cultivo sob invernos rigorosos, desde que se tenha radiação solar.

Essas estruturas são utilizadas há muito tempo, mas com o desenvolvimento de tecnologias como filmes plásticos e estruturas galvanizadas, entre outras, a expansão do cultivo em estufas agrícolas foi significativa.

A estufa controla as variáveis de produção
Crédito: Taciana Guimaro

Vantagens do sistema

A horticultura e floricultura são os segmentos que mais se destacam em relação ao cultivo em estufas. Porém, na olericultura, a produção em estufas é expressiva e tende a permanecer em crescimento em função das inúmeras vantagens deste sistema.

Em condições tropicais, a retenção de calor na estufa não é necessária e pode, inclusive, tornar-se problemática. No entanto, sistemas eficientes de manejo, designs específicos e tecnologias de redução da temperatura permitem excelente produção.

Neste caso, a estufa tem como vantagem o melhor controle das variáveis de produção. Em um ambiente no qual o controle ambiental é aplicado com maior facilidade, é possível fornecer para as plantas os recursos necessários para produção, de modo a suprir as necessidades destas sem desperdícios de insumos e, consequentemente, com preservação ambiental.

Peculiaridades das estufas

A área de cultivo no interior de uma estufa é menor se comparada ao campo. Trata-se de uma estrutura que requer investimento inicial elevado. Porém, com o manejo apropriado é possível aumentar a densidade de plantas que, aliada ao menor risco de perdas por intempéries climáticas e pragas, por exemplo, garantem alta produtividade e maior rendimento para o produtor.

Quando se considera a produção de hortaliças seguindo critérios de um sistema orgânico, a área reduzida de cultivo e a barreira física que a estrutura representa para evitar a entrada de pragas são fatores positivos do cultivo em estufas.

Em uma área menor, as possibilidades de aplicação de técnicas de monitoramento de pragas e de controle manual são altamente viáveis. As telas utilizadas nas laterais da estrutura são eficazes quanto a impedir a entrada de insetos, o que reduz significativamente o risco de infestações e a necessidade de uso de defensivos.

Em relação à ocorrência de doenças, além do uso de quebra-ventos, o produtor deve ficar atento ao manejo fitotécnico e do ambiente no interior da estufa.

É importante se atentar ao fato de que a presença de uma estrutura entre a atmosfera e a planta resulta em um microclima diferente daquele presente a céu aberto. Essa característica do cultivo em estufa é essencial, pois traz a necessidade de adaptação do manejo de irrigação, adubação e fitossanitário para este ambiente particular.

Clima interno

A dinâmica energética no interior da estufa agrícola é alterada, e com isso também serão alterados aspectos como evapotranspiração e absorção de nutrientes, por exemplo. Tais alterações vão implicar na necessidade de reavaliação do manejo da irrigação e da quantidade de adubação fornecida às plantas.

Sendo assim, o produtor deve considerar inicialmente que o manejo aplicado ao cultivo no campo aberto não deve ser simplesmente transferido ao cultivo em estufa.

O controle de variáveis, como temperatura e umidade, pode ser realizado pela promoção da ventilação no interior da estufa. Para isso, o planejamento já é iniciado na escolha do local de instalação, design da estrutura e materiais utilizados.

Pé direito da estufa

Normalmente, estufas localizadas em regiões de clima quente devem apresentar pé direito mais elevado e aberturas zenitais para saída do ar aquecido. É comum o uso de telas de trama fina para evitar a entrada de insetos vetores de viroses. Essas telas impedem também a circulação de ar.

Com o aquecimento do ar no interior da estufa, ocorre a formação de bolsões de ar quente que se elevam. O pé direito alto tem como função evitar que este ar quente seja acumulado próximo ao nível das plantas. Já as aberturas zenitais permitirão que este ar saia do ambiente através do efeito chaminé. Esta movimentação de ar permitirá também o controle da umidade do ar.

Irrigação e ventilação

Além disso, o manejo da irrigação deve ser considerado, pois o excesso de água, associado a uma ventilação insuficiente, pode se acumular no ar durante o dia e precipitar à noite, causando molhamento das folhas e favorecendo a ocorrência de doenças.

Este fator será agravado se houver no entorno da estufa fontes de elevação da umidade ambiente como, por exemplo, lagoas. Por isso a importância da escolha do local de construção da estufa.

Ainda considerando a ventilação e umidade, a abertura das janelas zenitais devem seguir a direção dos ventos predominantes do local. Para tal, é possível utilizar tecnologias de ventilação artificial associada a sensores que permitirão controle mais eficiente do clima.

Manejo orgânico

Todas as práticas do manejo orgânico podem ser adotadas no cultivo em estufa. É possível o cultivo em consórcio e rotação de culturas. A adubação orgânica e a aplicação de defensivos naturais também podem ser realizadas.

No entanto, as dosagens devem ser devidamente adaptadas. A liberação de predadores naturais para controle biológico é altamente eficiente em cultivo em estufa. Para culturas que necessitam de polinizadores, como cucurbitáceas, a instalação de colmeias no interior da estufa é recomendada.

Um dos principais desafios da produção orgânica de hortaliças em estufas é a questão do equilíbrio ecológico em um ambiente modificado. Os princípios da agricultura orgânica envolvem não apenas o manejo específico, mas também a sustentabilidade do uso dos recursos, a origem dos recursos e o ambiente de produção em sua totalidade.

Mais segurança

A produção em estufas é capaz de promover a produção de alimentos mais seguros e limpos. As práticas de manejo podem ser perfeitamente adaptadas, porém, alguns aspectos ainda podem exigir ajustes para completo atendimento à legislação.

O uso dos filmes plásticos é um tema que pode ser sensível aos princípios da agricultura orgânica. No entanto, os cuidados com a aplicação e manutenção dos filmes podem contribuir para maior durabilidade.

Ainda, com o desenvolvimento de tecnologias que conferem maior resistência aos filmes, a necessidade de trocas pode ser reduzida. A área limitada também pode ser uma barreira à biodiversidade necessária no ambiente orgânico. 

É possível que, com a ampliação da demanda pela inclusão do sistema orgânico na produção em estufas, ou vice-versa, os debates possam ser estimulados e novas estratégias de produção unindo os dois sistemas sejam desenvolvidas.

Biodiversidade

O solo é fator essencial na agricultura orgânica. A manutenção da biodiversidade do solo, da matéria orgânica e do equilíbrio entre os diversos componentes do solo devem ser priorizados na produção orgânica.

Os cultivos convencionais em estufa tendem a ser predominantemente realizados em recipientes, com uso de tecnologias como fertirrigação com adubos minerais. O cultivo em solo é limitante devido a alguns fatores.

Sob o aspecto fitossanitário, a presença de patógenos de solo é um fator que pode inviabilizar o cultivo em função da agressividade, ampla gama de hospedeiros e difícil controle destes patógenos. Portanto, antes de iniciar o cultivo orgânico, esse aspecto deve ser cuidadosamente avaliado.

Em relação à manutenção da matéria orgânica, o uso de consórcios ou rotação de culturas com adubos verdes ou plantas de cobertura e incorporação de materiais como estercos são recomendados.

As práticas do manejo orgânico podem ser adotadas em estufas
Crédito: Nòrtene

A atenção necessária, no entanto, é a mesma dispensada ao uso de adubos minerais, ou seja, é preciso se atentar para as dosagens. No interior da estufa, devido à cobertura plástica, não há precipitação, ou seja, os materiais não são carreados pela chuva.

No campo, adubações em excesso podem ter menor impacto para a produção já que podem ser “lavadas” após períodos de chuva, porém passam a impactar o ambiente já que podem atingir reservas de água subterrânea. Por outro lado, na estufa o excesso de adubos pode ser acumulado e causar perdas na produção. Se houver elevação excessiva dos teores de nutrientes o cultivo pode ser inviabilizado. Sendo assim, é possível verificar que a produção na estufa requer um monitoramento muito mais intenso do solo.

Dicas

A adubação orgânica pode ser realizada a partir da aplicação de resíduos vegetais e animais. Entre os resíduos vegetais, os adubos verdes são opções viáveis. São espécies que podem ser cultivadas em períodos nos quais não há culturas comerciais na área ou mantidas em consórcio durante o cultivo das hortaliças.

Ao final do ciclo, são incorporadas ao solo e, além da matéria orgânica com sua função de condicionadora do solo, estas plantas liberam também nutrientes, especialmente nitrogênio, já que são espécies que possuem como característica a capacidade de alta fixação de nitrogênio.

Aliada aos adubos verdes, espécies com baixa relação C/N podem ser também cultivadas para incorporação de resíduos de degradação mais lenta que podem contribuir para o aumento da matéria orgânica. Já os resíduos animais são estercos que, além de nutrientes e demais compostos bioativos, também são fontes de microrganismos benéficos.

Alimentos limpos

O cultivo de hortaliças com base na agricultura orgânica em estufa é uma opção viável para produtores que buscam a produção de alimentos limpos, pois quando estabelecido sob práticas de manejo adequadas, o cultivo em estufa pode reduzir significativamente a ocorrência de problemas fitossanitários e promover um ambiente favorável ao bom desenvolvimento e produção das plantas.

Além disso, quando aliado às práticas de sustentabilidade da agricultura orgânica, é possível promover ganhos ambientais e maior eficiência do uso de recursos e, consequentemente, da produção como um todo.

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