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Hugo Agripino de Medeiros
Jerônimo Vieira de Araújo Filho
Engenheiros agrônomos da EPAGRI
A sarna da macieira e mancha foliar da gala, doenças causadas pelos fungos Venturia inaequalis e Colletotrichum spp., respectivamente, são frequentemente assinaladas como as principais enfermidades da macieira no Brasil.
Entretanto, uma terceira doença vem aumentando em importância e tem limitado a comercialização de mudas e a produção da maçã no Sul do País. Esta doença é denominada “cancro europeu“, a qual é desencadeada pelo fungo Neonectria ditissima (sinonÃmia: Nectria galligena).
De lá para cá
Este patógeno foi detectado pela primeira vez no Brasil em 2002, em mudas de macieira produzidas na cidade de Vacaria (RS). No ano de 2014, N. ditissima foi reclassificada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) como praga quarentenária A1, ou seja, não presente no país, para praga quarentenária A2, praga limitada a determinadas regiões do país (Instrução Normativa nº 12, de 23 de maio de 2014).
N. ditissima sobrevive em gemas e tecidos enfermos do hospedeiro, não apresentando sobrevivência por saprofitismo, nem tampouco sob a forma de estruturas de resistência. Este patógeno é polÃfago, possuindo uma ampla gama de hospedeiras, nas quais estão inclusas espécies de Malus, Pyrus, Fagus, Populus, Salix, entre outras.
O fungo produz dois tipos de esporos, ambos infectivos. Durante a fase sexuada (N. ditissima) ocorre a formação de ascomas (peritécio), usualmente avermelhados. Os ascósporos produzidos nestes corpos de frutificação podem ser liberados e dispersos pelo vento por até 10 km.
Na fase assexuada (Cylindrocarpon heteronema) os conÃdios originam-se a partir de estruturas esbranquiçadas, denominadas esporodóquios. A chuva pode atuar tanto na liberação dos conÃdios quanto na dispersão por respingos. O aumento da epidemia dar-se-á pela disseminação de ambos os esporos.
De onde vem
O inóculo primário do patógeno pode ser oriundo de mudas infectadas, de ferramentas infestadas ou mesmo de pomares vizinhos. Dependendo das condições ambientais, plantas infectadas podem apresentar sintomas dois ou três anos após a infecção pelo patógeno.
Dessa forma, mudas de macieira podem estar sendo comercializadas como sãs devido a não presença de sintomas, embora possam conter o patógeno em seus tecidos.
Uma vez sob tecido do hospedeiro, esporos do fungo germinam preferencialmente entre 20 e 25ºC. O período mÃnimo de molhamento varia conforme a temperatura média, sendo que quanto maior a temperatura, menor será o período de molhamento mÃnimo necessário para infecção.
É importante mencionar que a infecção ocorre exclusivamente por aberturas, sejam elas naturais ou ferimentos. As aberturas naturais mais importantes são aquelas formadas pela queda das folhas no outono e na colheita dos frutos, enquanto que os ferimentos são oriundos de podas e outros tratos culturais.
Sintomas
Os sintomas da doença consistem de cancros com margens definidas, variando de avermelhada a marrom-escuro, podendo ser encontrados em ramos de um ou mais anos, bem como no tronco das plantas. O inchaço da região afetada é típico da patologia.
Frutos também podem ser contaminados já na época da floração ou em pré-colheita, desenvolvendo uma podridão firme, de cor marrom-escura. Sinais do fungo, sobretudo esporodóquios, são comumente observados no campo infestado.
Faz-se necessário um treinamento de técnicos, produtores e operários no sentido de amplificar o trabalho de fiscalização; afinal, é comum confundir cancro europeu com cancros incitados por outras espécies de fungos, tais como o cancro de papel, causado por Botryosphaeria.
Epidemiologia
Diversos fatores são responsáveis pelo atual cenário epidemiológico do cancro europeu na região sul do Brasil, entre os quais se destacam o predomÃnio de variedades de macieiras altamente suscetíveis (Fuji e Gala), bem como a ocorrência de condições ambientais (período de molhamento foliar e temperatura) favoráveis à reprodução e disseminação do patógeno.
Em áreas caracterizadas pela elevada incidência da doença tem-se constatado a redução da vida útil dos pomares, bem como o aumento dos custos de manutenção destes. Estes fatos devem-se, respectivamente, ao comprometimento dos ramos e caule das plantas, assim como à indisponibilidade de fungicidas eficientes para o manejo desta doença e ao aumento da demanda por mão de obra utilizada no monitoramento/tratamento individual das plantas afetadas.
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