Eduardo Elias Abrahim
Engenheiro agrônomo, consultor e presidente da Atriemg (Associação dos Triticultores do Estado de Minas Gerais)
eeabrahim@gmail.com
Esse ano tivemos uma produção de trigo recorde no País, chegando próximo de 10 milhões de toneladas. O fato que mais impactou na decisão dos produtores foi o preço internacional, que subiu por causa da guerra Rússia X Ucrânia.
Além disso, o clima foi propício e também aa novas variedades lançadas pelos obtentores. Devemos continuar esse ano com aumento de área, pois os preços estão altos e tivemos problemas de produção em alguns importantes países exportadores, como a Argentina, que enfrenta uma seca severa, sendo este nosso principal fornecedor do cereal.
O Brasil consome, por ano, aproximadamente 12,5 milhões de toneladas de trigo, então, temos muito a crescer para chegarmos à autossuficiência. Com certeza, nos próximos anos seremos exportadores do cereal.
Trigo no Cerrado
Hoje, o trigo é uma realidade no Cerrado, e a cada ano vem ampliando áreas novas, tanto no irrigado quanto no sequeiro (safrinha). Com a chegada de variedades desenvolvidas para nossas condições climáticas, e agora com o projeto aprovado para o desenvolvimento do trigo tropical, que já está sendo executado pela Embrapa, com apoio dos sindmoinhos de Goiás e Minas e de outros atores envolvidos nesse processo. com certeza teremos avanços importantes em novas áreas, que serão validadas para o cultivo do cereal.
Vantagens dessa produção
A maior vantagem dos trigos produzidos no ambiente Cerrado são a qualidade industrial (dentre as melhores do mundo) e também a previsibilidade de colheita, uma vez que colhemos na época seca, que permite um produto final de qualidade superior, proporcionando aos moinhos a produção de farinhas premium.
O aumento da área plantada no Cerrado chamou a atenção das grandes empresas de genética, como Biotrigo, OR sementes, Semevinia e a própria Embrapa, que estão trabalhando com afinco para entregar variedades com tolerância às doenças e também à seca, o que é muito importante, principalmente para a produção de sequeiro (safrinha).
Dificuldades
As maiores dificuldades em relação à expansão da cultura são, principalmente, a falta de informação técnica sobre a cultura, que não é ainda tradicional por aqui. Esse assunto está sendo tratado com eficiência pela Embrapa nesse projeto de trigo tropical.
Novas variedades
As empresas obtentoras estão trazendo variedades muito importantes para a expansão do trigo, como a Biotrigo, com muita tolerância às doenças, a Embrapa com tolerância à seca e a OR com bons materiais, além de outras que estão iniciando a produção para a região do Cerrado.
O plantio do trigo traz para o sistema produtivo uma excelente opção de rotação de culturas, agregando tanto em rentabilidade quanto na melhoria da produtividade de culturas subsequentes.
Permite, ainda, uma redução importante nas doenças de solo (rizoctonia, fusarium, mofo-branco, etc.), e também diminuição dos nematoides nocivos às principais culturas. Outro benefício é no controle de ervas daninhas, uma vez que usamos princípios ativos diferentes dos utilizados para soja e milho.
Rentabilidade da cultura
Em termos de rentabilidade, o sistema irrigado permite um retorno excelente, pois alcança produtividades recordes, chegando a mais de 9 mil quilos por hectare (média de 6 mil), no sistema de sequeiro.
O retorno depende muito das condições climáticas, mas, na média de vários anos, tem se mostrado muito interessante, entrando numa janela de plantio em que não se planta mais milho.
Pesquisa mostra viabilidade da triticultura no Cerrado
Uma pesquisa realizada pela Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), Embrapa Trigo (RS) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) com o trigo cultivado em cinco cidades do Cerrado Mineiro indicou que a região pode produzir um trigo de alta qualidade e valor nutricional.
Os dados foram publicados no Journal of Food Processing and Preservation sob o título “Brazilian Cerrado Wheat: Technological Quality of Genotypes Grown in Tropical Location” (Trigo do Cerrado Brasileiro: qualidade tecnológica dos genótipos cultivados em locais tropicais”, em tradução livre).
O trabalho contou com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
A chamada “tripocalização” do trigo é considerada uma das principais fronteiras da pesquisa agropecuária, com o desenvolvimento de variedades do grão mais resistentes ao clima mais quente do Brasil central. Hoje, a produção é concentrada no Sul.
Amostras
Os pesquisadores estudaram 34 amostras de 12 genótipos de trigo desenvolvidos pela Embrapa e cultivados sob sistemas irrigado e de sequeiro. Os testes clássicos de caracterização físico-química e reológica (viscosidade) mostraram qualidade tecnológica muito boa.
As análises indicaram elevada força de glúten na maior parte delas, indicando que o cereal é apropriado para ser utilizado na panificação ou mesmo em mescla com trigo de força menor, em caso de ser melhorador.
“Existe um enorme potencial comercial a ser explorado com o cultivo do trigo em ambientes tropicais, como o Cerrado Brasileiro”, afirma Martha Zavariz, pesquisadora de Laboratório de Qualidade de Grãos, da Embrapa Trigo.
De acordo com a pesquisa, além do desempenho tecnológico, o trigo no Cerrado mostra bom rendimento no campo e na agroindústria. A expectativa é que o resultado incentive ações de pesquisa e desenvolvimento para geração de novas cultivares adaptadas ao solo nacional e estimule políticas públicas de fomento à cadeia produtiva, reduzindo a dependência brasileira da importação do cereal.