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Fertilizantes organominerais:Do surgimento até as novas possibilidades

Autores

Reginaldo de CamargoProfessor de Gestão Ambiental na Agricultura – Universidade Federal de Uberlândia (UFU)

Regina Maria Quintão LanaProfessora de Fertilidade e Nutrição de Plantas – UFU

Mara Lúcia Martins MagelaDoutoranda em Fitotecnia – UFU

Miguel Henrique Rosa FrancoPós-doutorando em Agronomia – UFU

Foto: Shutterstock

Um observador mais atento do mercado de fertilizantes no Brasil certamente concordaria com a afirmação de que há alguns anos estamos vivenciando uma nova fase na disponibilidade de novas tecnologias no segmento de nutrição de plantas. 

Apesar da quase inexistência de incentivos ou políticas públicas específicas para fertilizantes que se utilizam de resíduos ou subprodutos em sua composição, o mercado de fertilizantes orgânicos, organominerais, condicionadores de solo e resíduos para as culturas responde por quase 1/3 do faturamento em fertilizantes no Brasil (Abisolo, 2019).

Estamos nos referindo a uma ampla gama de insumos agrícolas que apresentam fontes orgânicas ou elementos dela extraídos em sua composição, com tecnologia incorporada e potencial para promover benefícios aos solos e às plantas, sem deixar de lado a preservação do meio ambiente e o manejo sustentável das lavouras.

Atendidas às legislações específicas, ao longo dos anos o próprio mercado tem se encarregado de selecionar e eleger os produtos mais eficientes e de alta qualidade para nutrição das culturas. Inúmeras pesquisas realizadas no Brasil e no mundo, ao longo de décadas, comprovaram os benefícios que a adubação com base orgânica proporciona aos aspectos químicos, físicos, biológicos e ambientais do solo, bem como às plantas.

Expansão de cultivos

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O que se observa na agricultura moderna de sistemas altamente integrados e tecnificados de semeio é a acelerada expansão das áreas de cultivo, especialmente no Cerrado. A utilização de materiais genéticos cada vez mais produtivos, exigentes e exportadores de nutrientes do solo; altos custos ao produtor com fretes de adubos orgânicos e a reduzida janela de tempo entre cultivos numa mesma área acabaram por limitar a adubação orgânica convencional a poucas espécies e condições de manejo.

Todavia, esse cenário não impediu que fontes orgânicas e seus derivados fossem pesquisados e utilizados no desenvolvimento de novas tecnologias. 

Atualmente, fertilizante orgânico pode ser definido como fertilizante de natureza orgânica, de origem natural ou obtido por processos de tratamento de subprodutos agroindustriais, rurais ou urbanos, que além de aportar nutrientes para as plantas, contribui para a melhoria das características químicas, físicas e biológicas do solo.

Podem ser fluidos ou sólidos e serem aplicados de diferentes formas, como no solo, folha, fertirrigação, hidroponia e nas sementes.

Realidade brasileira

Ao se destacar a urgência no desenvolvimento de política de Estado que proteja, estimule e torne cada vez mais viável a indústria dos resíduos orgânicos em alta escala, de modo sustentável, leva-se em consideração o cenário dos fertilizantes no Brasil.

A cadeia da reciclagem como um todo no País demanda ações planejadas, detalhadas e integradas para as próximas décadas e, na medida do possível, mais protegida de visões equivocadas ou sugestionadas de gestores de políticas públicas.

Segundo um amplo levantamento apresentado no Setorial 45 do BNDES de 2017, o déficit estrutural na demanda por macronutrientes no mercado brasileiro é decorrente da força e competitividade do agronegócio e das restrições estruturais da indústria de produção de fertilizantes.

Basta observar que o Brasil tem uma produção relevante de fertilizantes fosfatados e nitrogenados que representaram, em 2014, 42 e 26% do consumo nacional, respectivamente, segundo apontamentos da FIESP em 2016. Todavia, nos fertilizantes potássicos, a produção nacional representou apenas 2% do total consumido.

De resíduos a fertilizantes

Por outro lado, ainda de acordo com o BNDES, a abundante produção de resíduos por alguns setores do agronegócio possibilita que os nutrientes presentes nesses rejeitos possam ser reaproveitados, reduzindo assim a destinação ambientalmente incorreta e atribuindo maior retorno econômico ao agronegócio brasileiro.

A produção de resíduos dos setores sucroalcooleiro, bovino, suíno e avícola poderia suprir, aproximadamente, metade da demanda de macronutrientes no Brasil, em um cenário hipotético de aproveitamento de todos os resíduos gerados por esses segmentos.

Apenas a conversão dos nutrientes presentes nos segmentos que apresentam menos desafios logísticos (sucroalcooleiro, suíno e avícola de corte) representaria um mercado potencial superior a US$ 1 bilhão anuais.

Levantamento como este, capaz de impressionar qualquer gestor na atualidade, provavelmente foi percebido há décadas por países como Alemanha, Japão e Austrália, cujos projetos, políticas e investimentos mantiveram-se por sucessivos governos que conduziram estas nações a um status muito além da modesta realidade brasileira no tocante à gestão econômica e ambiental de resíduos.

Dentro desses setores, e incluindo outros segmentos agroindustriais e urbanos, diversos resíduos orgânicos com grande potencial de serem usados na agricultura podem ser apontados como fontes eficientes para compor a produção de fertilizantes, como a torta de filtro, bagaço de cana, composto de barn, cascas de café, cama de frango, turfas, resíduos de árvores, resíduos de batata, lodo de esgoto e etc.

A base de tudo

Num passado não muito distante, o modelo de adubação que se consolidou no Brasil a mais de meio século e perdura até os dias atuais se baseia em fertilizantes minerais de alta concentração e solubilidade, como aqueles adotados em países de clima temperado.

Este sistema é defendido por alguns técnicos e pesquisadores, mas também é alvo de inúmeros questionamentos, em especial sob a alegação de que este modelo importado não atende com a mesma eficiência às peculiaridades das nossas condições de clima e solo. Solo este que, predominantemente, passou por processos de intemperismo e é considerado ácido, pobre em nutrientes e em teores de matéria orgânica.

Em condições brasileiras, os fertilizantes exclusivamente minerais apresentam índices de aproveitamento dos nutrientes baixos. De maneira geral, tem-se que a taxa de eficiência do nitrogênio (N) é de aproximadamente 50%. Isso ocorre porque o N aplicado via fertilizante mineral apresenta muitas perdas que incluem processos de volatilização (como na forma de amônia, N2 ou óxido de nitrogênio, no caso de desnitrificação), ou até mesmo por carreamento superficial, lixiviação e imobilização no solo.

As taxas de aproveitamento do fósforo são ainda mais baixas, uma vez que o fator de eficiência deste nutriente é de aproximadamente 20 a 35%. O fósforo é pouco móvel no solo, sendo fortemente adsorvido nas cargas do mesmo. Além disso, é facilmente perdido por processos de erosão, quando ocorrem perdas de matéria orgânica e das partículas coloidais.

Fertilizantes fosfatados sob a forma de fosfato solúvel em água, quando em contato com a solução do solo, solubiliza o fósforo tornando-o disponível. Parte deste nutriente fica diluído na solução do solo e parte fica adsorvida ao complexo coloidal (argilas).

Em solos ácidos que apresentam elevados teores de ferro e alumínio, parte do fósforo disponível é fixado, formando compostos de ferro e alumínio, indisponíveis para as plantas.

 Quanto ao potássio, a eficiência da adubação é de aproximadamente 70%. Isso porque os fertilizantes potássicos são altamente solúveis e perdem-se facilmente ao longo do perfil do solo. Em solos de textura média a arenosa, essas perdas são ainda mais expressivas devido à baixa capacidade de troca catiônica.

Se, por um lado, em nossas condições edafoclimáticas a adubação exclusivamente via fontes minerais concentradas está sujeita a elevadas taxas de perdas e apresentam potencial para contaminação do solo, de águas subterrâneas e superficiais, a adubação exclusivamente orgânica também apresenta limitações sob inúmeros aspectos, razão pela qual seu uso exclusivo está restrito a poucas culturas e áreas de menor tamanho.

Dessa forma, a mistura de fontes orgânicas e minerais permitiu combinar as qualidades dessas fontes, originando os fertilizantes denominados organominerais.

Quem são eles

Por definição, o fertilizante organomineral é formulado com nutrientes minerais naturais ou sintéticos em mistura com fontes de material orgânico de origem natural ou obtidos a partir de processos de tratamento de subprodutos agroindustriais, rurais ou urbanos, que além de aportar nutrientes para as plantas, contribui para a melhoria do condicionamento do sistema solo-planta.

Os fertilizantes organominerais reúnem uma série de vantagens quando comparados a qualquer fonte aplicada de forma isolada, seja de um fertilizante mineral ou orgânico exclusivamente. Isso ocorre porque o organomineral apresenta as características ótimas das duas fontes, que não poderiam ser alcançadas individualmente pelas mesmas (Barros, 2019).

Uma das caraterísticas responsáveis pela maior eficiência do organomineral em relação a outras fontes de fertilizantes é a proteção que a matéria orgânica exerce sobre os nutrientes minerais. Como consequência desta proteção, ocorre liberação gradual dos nutrientes na solução do solo (slow release); diminuição dos processos de perdas, o que aumenta a eficiência de aproveitamento pelas culturas; não ocorre segregação porque os macronutrientes (N, P e K) e micronutrientes estão em um mesmo grânulo ou pellet; quelatiza os micronutrientes, aumentando a sua disponibilização no solo; aporta substâncias húmicas, não húmicas e aminoácidos; aumenta a atividade biológica e protege as raízes do excesso de salinidade causado pela adubação mineral.

As primeiras fábricas de fertilizantes organominerais no Brasil surgiram há mais de 20 anos, principalmente nas regiões sul e sudeste, em função da abundância de matérias-primas nestas localidades.

Essas empresas trabalhavam com fertilizantes orgânicos simples, principalmente estercos, e passaram a misturá-los com fertilizantes inorgânicos. Já o setor de fertilizantes minerais é mais antigo, sendo que as primeiras fábricas de fertilizantes no Brasil surgiram nos anos 1940 e dedicavam-se exclusivamente à mistura NPK com base em fertilizantes simples importados.

A indústria de tecnologia em nutrição vegetal no brasil apresenta números expressivos, com faturamento de R$ 7,6 bilhões em 2018 com um crescimento de 19,3% em relação ao ano anterior.

A cadeia da soja, milho e hortifrúti absorvem aproximadamente 69% de sua produção para estes ramos do agronegócio (Abisolo, 2019). Entretanto, os desafios da indústria brasileira de fertilizantes são grandes e sem previsão de mudança a curto e médio prazos, uma vez que a matéria-prima representa 50% dos gastos, no qual 41% é importado.

O segmento de fertilizantes organominerais representa atualmente 12% do faturamento anual, todavia, diferentes fatores apontam para uma grande expansão desse fertilizante nos próximos anos.

Evolução

Além do aumento no número de indústrias de fertilizantes organominerais na região sul, sudeste e centro-oeste, a qualidade dos fertilizantes organominerais também evoluiu consideravelmente em aspectos químicos e físicos.

O aumento na utilização dos fertilizantes organominerais tem ocorrido em virtude dos resultados positivos obtidos nos segmentos de grãos (soja, milho, sorgo, feijão, café), hortaliças, frutíferas, cana-de-açúcar e pastagens.

Um dos fatores decisivos e responsáveis pelo expressivo avanço na qualidade dos fertilizantes organominerais é a pesquisa científica aliada à prática em campo, que validam os produtos ou novas opções de manejo de adubação.

A disponibilidade de publicações científicas de alta qualidade com organominerais nos últimos anos apresentou um grande crescimento, com trabalhos abordando diferentes aspectos de qualidade e eficiência desses fertilizantes.

Diversos estudos científicos já comprovaram a eficiência dos fertilizantes organominerais para inúmeras espécies, incluindo as principais culturas plantadas em condições brasileiras, como soja (Almeida Júnior, 2017; Duarte et al., 2013; Alane, 2015;); milho (Franco, 2019; Nunes et al.,2015; Magela et al., 2019), café (Costa et al., 2015; Carmo et al., 2014; Acra, 2015); cana-de-açúcar (Sousa, 2014; Teixeira, 2013; Ramos 2013; Gonçalves, 2018); tomate (Almeida, 2017; Caixeta; 2015); batata (Cardoso et al., 2017); alho (Justino Neto; 2018); cebola (Luz et al.; 2018); alface (Zandonadi et al., 2018); capim-marandu (Resende Júnior et al., 2016).

Sustentabilidade

O mercado de fertilizantes no Brasil tem demandado o uso de produtos mais sustentáveis; redução da dependência de matéria-prima importada como estratégia de proteção da agricultura e da economia nacional; bem como a elaboração de uma política de estado integrada e de longo prazo para a destinação de subprodutos e resíduos urbanos industriais e agropecuários com foco na fabricação de fertilizantes.

Nesse cenário, o fertilizante organomineral já é um segmento consolidado e uma excelente tecnologia para o manejo mais eficiente das culturas. O que se tem de perspectiva para os próximos anos é a inclusão de novas tecnologias e processos industriais, como incorporação de microrganismos ao grânulo ou pellet para controle de doenças e pragas, como nematoides; adição de reguladores de crescimento ou mesmo de outros insumos agrícolas ao fertilizante organomineral, abrindo infinitas possibilidades para esse setor que está em grande expansão.

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