Bernardo Melo Montes Nogueira Borges
Engenheiro agrônomo, doutor em Produção Vegetal e gerente técnico na BRQ Brasilquímica
Não precisamos lembrar nossos caros leitores de que o Brasil é um país tropical, mas este ano, em específico, a tropicalidade está mais acentuada, com destaque para a região central do país.
A previsão climática vem se confirmando neste início de safra. Temperaturas acima da média e falta de chuva no início do plantio são pesadelos constantes da safra 2023/24. Estes fatores, somados, fazem com que sigamos com plantio atrasado em grande parte da área agrícola do país.
Curiosamente, também temos a previsão histórica de ser a maior área plantada da agricultura brasileira, mas, infelizmente, ao que tudo indica, não teremos problemas apenas no início da safra.
Veranicos
Outro ponto importante a ser destacado é o famoso veranico de janeiro, característico de anos com influência do El Niño. Tudo bem, não podemos prever com precisão se vai ser severo ou moderado, mas podemos prever se vai acontecer ou não, e vai.
Que altas temperaturas e falta de chuva afetam diretamente a produtividade das culturas vocês já sabem, e os motivos estão basicamente relacionados à falta de água e superaquecimento da superfície do solo.
Entretanto, outros fatores que acontecem muito antes de conseguirmos ver os efeitos do calor e falta de água acometem as plantas. Fisiologicamente falando, quando a folha “torceu”, sua produtividade, infelizmente, já foi comprometida.
Uma linha tênue
Pode-se observar, em diversos estudos, que a maioria das plantas tem por temperatura ideal de trabalho algo entre 25-30°C e que abaixo ou acima destas a planta entra em estresse e cessa suas atividades fotossintéticas.
Plantas em ambientes estressantes com temperaturas elevadas e alta intensidade luminosa respondem quase que imediatamente, fechando estômatos e interrompendo a fotossíntese.
Mesmo que o ambiente tenha água disponível, folhas se enrolam, perdem turgidez, são queimadas por raios solares, enfim, está instalado o caos.
Isto gera um gasto excessivo de energia pela planta, que tenta controlar esse aumento de temperatura, a qual provoca perdas de produtividade. Entretanto, se conseguirmos diminuir este estresse abiótico durante as horas mais quentes do dia e fazer com que, ao sofrer menos com este efeito, a lavoura consiga manter em níveis normais sua taxa fotossintética e, consequentemente, aumentar a fotossíntese líquida, teremos uma maior quantidade de fotoassimilados e a manutenção, ou até mesmo incremento em produtividade.
Sim, é possível
Essa ferramenta existe! Não só existe, como já vem sendo utilizada na fruticultura há algum tempo para proteger e manter a qualidade dos frutos de mesa e exportação. O protetor solar de plantas cria uma barreira na superfície do vegetal que reflete os raios solares e acaba por diminuir a temperatura superficial e interna dos frutos e folhas.
Neste momento, dúvidas vão surgindo, porque, de certa forma, é contraintuitivo pensar que não queremos que a luz chegue à planta, mas o que acontece é que, diante de diversos espectros de luz, os cloroplastos conseguem absorver e assimilar apenas alguns comprimentos.
Entenda o processo
A clorofila A e o β-carotenoide conseguem absorver luz do espectro azul e parte do vermelho, e a clorofila B apenas espectro azul, de maneira geral. Todos os outros espectros de luz incidentes visíveis e não visíveis, como os ultravioletas (UV-AB) e infravermelhos, são refletidos ou perdidos em forma de calor.
O problema é um pouco maior, pois os raios UV, da mesma forma como em nossos corpos, queimam as folhas e assim como geram a vermelhidão na nossa pele, degradam a parede celular e organelas internas de frutos e folhas, causando aquele aspecto feio de tecido mole/podre.
Os raios infravermelhos são responsáveis diretos pelo aumento de temperatura superficial e interna, ocasionando fechamento estomático e todos os malefícios que altas temperaturas podem causar.
Proteção da planta
O protetor solar forma uma fina película na planta, que de maneira eficiente consegue refletir grande parte destes raios sem que a fotossíntese seja comprometida. Na verdade, faz com que a capacidade fotossintética dessas plantas seja beneficiada quando submetidas a diversos fatores de estresses abióticos, e não só temperatura.
Como mencionado anteriormente, a fruticultura vem utilizando esse tipo de produto para proteger frutos que serão vendidos como mesa ou exportados, mas cada dia mais essa tecnologia vem sendo aplicada em outras culturas, como café, tomate, algodão, soja, feijão, etc., que tem como foco principal manter a planta fora do estresse térmico, entre 12 – 16 h, quando a temperatura atinge seu máximo.
Assim, se consegue manter a temperatura da superfície tratada com o produto em média 6,3°C menor do que a sem ele (Figura 1).
Figura 1. Imagem térmica de tomate tratado com protetor solar (esquerda) e sem protetor solar (direita). Escala de cor mais fria para cor azul e mais quente para cor vermelha.
Conclusão
Neste contexto, é fundamental entender como você, caro leitor, pode tirar o máximo proveito lançando mão de tecnologias promissoras, mesmo que você tenha o melhor manejo para sua região.
Diante dos desafios climáticos impostos à agricultura brasileira nessa safra, ao minimizar o estresse abiótico e manter a capacidade fotossintética das plantas, esta tecnologia promete contribuir para o aumento da produtividade agrícola, mesmo em condições climáticas desfavoráveis.
Portanto, investir e expandir o uso dessa inovação pode ser crucial para garantir a segurança alimentar e o sucesso da agricultura no Brasil.