Stephanie Hellen Barbosa Gomes – stephaniehellen2011@gmail.com
Fernanda Moura Fonseca Lucas – fernanda-fonseca@hotmail.com
Engenheiras florestais e mestrandas pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia Florestal – Universidade Federal do Paraná (UFPR)
João Gilberto Meza Ucella Filho – Engenheiro florestal, técnico em Agronegócio e mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia da Madeira, Universidade Federal de Lavras (UFLA) – 16joaoucella@gmail.com
O cacau (Theobroma Cacao), originário de florestas pluviais tropicais, é uma árvore perenifólia que pode atingir até 8,0 m de altura, apta a clima quente e desenvolve-se bem em temperaturas entre 22º e 26ºC. Seu cultivo começou no Brasil em 1679 por meio da Carta Régia que autorizava os colonizadores a plantá-lo. Existem três variedades dessa espécie, que são agrupados em: criollo, forasteiro e trinitário.
O tipo forasteiro é o mais comum e o mais difundido dentro das áreas de produção de cacau, predominando nas plantações da Amazônia, Bahia e em algumas regiões da África, formando 80% da produção mundial.
Eles possuem frutos achatados de cor violeta e são conhecidos comercialmente como “básico” ou “comum”. Na região da Bahia, essa variedade passou por mutações, originando o cacau catongo que apresenta semente de cor branca. Já o grupo criollo apresenta um produto de maior qualidade porque possui frutos com uma polpa mais robusta e sementes grandes, comercialmente chamados de cacau-fino.
O cruzamento entre o tipo criollo e o forasteiro forma o terceiro grupo de variedade, chamado de trinitário, resultando em produtos de condição intermediária.
Produção
O cultivo do cacau atualmente está concentrado em três regiões do mundo, no sudoeste da Ásia, oeste da África e no Brasil. Aqui, o histórico da lavoura cacaueira é repleto de ascensões e quedas – o Brasil que já foi o maior exportador e hoje em dia ocupa a sétima posição mundial, sendo os Estados do Pará e a Bahia os maiores produtores nacionais.
Estima-se que as sementes advindas do Pará chegaram em solos baianos em 1746. A produção cacaueira apresentou sua maior expansão entre os anos de 1890-1930, principalmente devido às condições ambientais encontradas no Estado, além da disponibilidade de terra e de mão de obra.
No entanto, este cenário mudou no final do século XX. A cultura, que já vinha passando por uma crise devido à falta de incentivos de créditos aos produtos e ao baixo custo das commodities devido à expansão da atividade em países africanos, culminou em uma dizimação de boa parte da produção devido a uma doença conhecida como vassoura-de-bruxa.
Hoje, o cultivo passa por recuperação e tem apresentado resultados satisfatórios. Dentre os métodos de cultivo, destacam-se os sistemas agroflorestais, sistema cacau-cabruca e a pleno sol.
Sistemas agroflorestais
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A cobrança por produções em campo mais rentáveis e menos nocivas ao ambiente tem impulsionado a implantação, por meio dos produtores, dos sistemas agroflorestais (SAF’s). Este consiste na utilização de espécies florestais lenhosas consorciadas com culturas agronômicas e/ou animais, trazendo benefícios ambientais e produtos diversificados em um único terreno.
Com isso, as SAF’s são apontadas como opções preferenciais de uso da terra pelo seu alto potencial de aumentar o nível de rendimento em relação a aspectos agronômicos, sociais, econômicos e ecológicos.
Devido a se apresentar como uma cultura tolerante, associada com outros vegetais, o cacaueiro sempre foi naturalmente cultivado via sistema agroflorestal. Em diversas regiões, como Brasil, Nigéria e Camarões, a associação desta cultivar com espécies lenhosas é um método bastante difundido em virtude da compatibilidade e sustentabilidade de sistemas de produção multi-estratificados.
Um dos consórcios mais bem estabelecidos do cacau é com a seringueira. As culturas não são concorrentes, sendo consideradas complementares, pois além de extrair nutrientes em camadas diferentes do solo, partilham do mesmo polinizador, podendo, assim, otimizar a mão de obra e melhorar a receita. Entretanto, outros modelos também podem ser utilizados em SAF, como a consorciação de cacaueiros e pupunheiras em renques, teca em renques, assim como outras espécies arbóreas, como mogno (Swietenia macrophylla), cedro rosa (Cedrela odorata) e castanha-do-pará (Bertholletia excelsa).
Vale salientar que para cacaueiros jovens o fornecimento de sombra é essencial para o bom desempenho de produção. Além disso, os espaçamentos entre as árvores devem ser levados em consideração, podendo ser de no mínimo 6,0 x 3,0 m até 24 x 24 m, variação que é determinada pela espécie em uso.
Sistema a pleno sol
A produção a pleno sol é um sistema de cultivo que vem sendo difundido no Brasil nas últimas décadas. Em geral, são mecanizados, formados com material genético de alta qualidade com mudas multiclonais resistentes principalmente a vassoura-de-bruxa e com auxílio de quebra-ventos eficientes, promovendo um conforto térmico produtivo essencial para o estabelecimento e fixação da muda. No ano de 2018, agricultores do sul da Bahia colheram mais de 200 arrobas por hectare de cacau em sistema a pleno sol.
Embora venha apresentando bons resultados, necessitam de maior aporte de fertilizantes, agrotóxicos e em muitos casos, irrigação. Desse modo, os cultivos de cacau com pouca sombra ou a pleno sol são considerados por muitos, menos sustentáveis, envolvendo maiores riscos e custos de produção. Apesar disso, apresentam como vantagem a aplicação de tecnologia, possibilidade de fertirrigação e de produção de cacau fino.
Recomenda-se, neste sistema, o plantio inicial com outra cultura, como a banana. Após atingir altura média, as bananeiras ofereceram proteção ao vento e sombreamento para dar início ao plantio das mudas de cacau. As folhas das bananeiras liberam potássio no solo, importante nutriente para as mudas jovens.
Além disso, oferecem um importante subproduto complementar a receita, as bananas. Depois de dois anos da implantação das mudas, realiza-se a remoção das bananeiras, permanecendo o cultivo do cacau solteiro a pleno sol. Diversos produtores do sul da Bahia têm adotado este sistema e obtendo alta produtividade, o que se constitui como preocupação em relação à preservação a cabruca.
Sistema cacau-cabruca
A palavra cabruca é um termo regional derivado da frase “vem cá brocar” a mata para plantar cacau. É um sistema característico da região cacaueira do sul da Bahia, podendo ser considerado percursor dos sistemas agroflorestais. Consiste em um modelo sustentável de agricultura tropical, ao contrário do método à pleno sol, as cabrucas são plantações tradicionais, em que se baseia na inserção do cacau no estrato inferior da floresta.
O cacau implantado no sub-bosque de forma descontinua não prejudica as relações da vegetação remanescente. A cabruca possui alta biodiversidade e proporciona: maior conforto térmico, conservação do solo, reduz a evapotranspiração e a incidência de pragas. Também promove uma economia verde e atua como corredor ecológico ao manter a floresta em pé.
Neste modelo não há mecanização, havendo ausência de nivelamento ou preparo da terra, bem como, redução de consumo de insumos externos. Devido à produção ecológica, pode se certificar como orgânico e agregar valor ao produto final.
Embora tenha-se nas cabrucas um cultivo de baixo custo e de importante valor cultural e ambiental, os produtores sofrem com à baixa produtividade quando comparado a outros sistemas da cacauicultura e também devido a entraves legislativos, não pode haver comercialização das podas das árvores nativas.
Segundo Grazielle Sanches, que estudou a viabilidade econômica deste modelo produtivo, as cabrucas podem se tornar mais atrativas com a melhoria nos preços, proporcionado por um maior valor agregado, tanto pelo mercado do cacau-fino como pelo pagamento de serviços ambientais ou agregação de valor por certificações.
Recomendações gerais de manejo e armazenamento
O manejo do cacau, de modo geral (independente da variedade), requer cuidado, porque em condições de cultivo à pleno sol, a planta geralmente não atinge sua altura média. Indicando que essa espécie é tolerante a luz intensa e motivada pela competição entre plantas. O cacaueiro é um cultivo agrícola que exige certas condições climáticas e de solo para o seu crescimento e bom desenvolvimento, tais como:
• Chuvas bem distribuídas ao longo ano, sendo adequada uma média anual de precipitação de 1.500 mm;
• Para a floração e frutificação a temperatura média adequada seria até 22 ºC;
• Para abertura das gemas e formação de frutos, a temperatura máxima não deve passar dos 28 ºC e a mínima até 9 ºC;
• Umidade relativa do ar acima de 70%;
• Ventos fracos;
• O solo deve ter uma textura argilo-arenosa com profundidade acima de 1 m e apresentar boa drenagem;
• É indicado que o lençol freático esteja a mais de 1,0 m de profundidade;
• Solo rico em matéria orgânica, caso contrário enriquecer o solo com adubo adicionando principalmente o nutriente fósforo, juntamente com micronutrientes. Fontes orgânicas também podem ser utilizadas, principalmente as que forneçam nitrogênio para melhorar a aeração do solo e ajudar a reter umidade.
Recomenda-se começar o plantio no início da estação chuvosa, mas caso o agricultor opte por outra época do ano é necessária irrigação complementar. É relevante para o cultivo do cacau que ele seja plantado em áreas sombreadas, principalmente durante o primeiro ano do plantio. Visto que é o período mais crítico para fixação e desenvolvimento das mudas.
Para os cultivos a pleno sol, recomenda-se a substituição da poda tradicional pela poda circular, uma vez que deixa a planta com menor porte, com tronco e galhos mais robustos, permitindo suportar a carga e a inserção adequada de luminosidade para eficiência fotossintética, além do uso de bioestimulantes que ajudam o cacau a reduzir o consumo de energia em situações de estresse.
Para o armazenamento, um ambiente adequado para acondicionar amêndoas deve ser construído em local seco, dispor de arejamento mas de modo a não apresentar espaços para entrada de roedores. Para evitar mofo e outros ataques não deve ultrapassar 90 dias.
Limitações da cacauicultura
A maior limitação da produção do cacau no Brasil são doenças fúngicas como a podridão-parda (Phytophthora spp.), o mal do facão (Ceratocystis cacaofunesta) e a vassoura-de-bruxa (Moniliophthora perniciosa), esta última sendo a mais agressiva. A vassoura-de-bruxa é disseminada principalmente pelo ar, podendo atingir qualquer fase do ciclo da cultura.
Todas as doenças citadas possuem técnicas de controle cultural, existindo hoje em dia procedências melhoradas geneticamente com resistência a estes organismos. Também deve-se ter cuidado com pragas como a broca do fruto (Conotrachelus humeropictus) e a broca do tronco (Steirastoma breve). Em questão social, a falta de planejamento, recomendações técnicas e linhas de crédito também são grandes responsáveis por insucessos produtivos.
Por que investir no cacau?
O cacau se apresenta como uma espécie de múltiplos usos, podendo ser empregada de forma in natura ou derivar subprodutos, como alimentos (chocolates e mel), cosméticos (hidratantes e shampoos) e fitofármacos.
De acordo com a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (CEPLAC), a cadeia produtiva desta cultivar é responsável, atualmente, por um produto interno bruto de aproximadamente R$ 20 bilhões.
As indústrias que mais se destacam no setor são as de processamento de amêndoas e produção de chocolate. No Brasil, no ano de 2018, o volume exportado de amêndoas foi de 616 toneladas. Além disso, os dados da AIPC e do IBGE enfatizam a importância da produção de cacau no Brasil socioeconomicamente, estimando que só a indústria processadora emprega diretamente quase 29 mil pessoas.
O Estado do Pará destaca-se como uma das principais produtoras de cacau no país, onde, só no ano de 2019, a produção de amêndoas ficou em torno de 133 mil toneladas, gerando emprego para aproximadamente 240 mil pessoas de forma indireta e outras 60 mil de forma direta. Na Bahia, três milhões de pessoas são beneficiadas pela produção cacaueira.
Levando em consideração os números satisfatórios da produção de cacau e as condições endafoclimáticas favoráveis que diversas regiões do Brasil oferecem para o plantio desta cultivar, o cacaueiro torna-se uma boa opção para investimento com retorno financeiro garantido.
Sustentabilidade
O cacau é um produto florestal não madeireiro (PFNM) de importância econômica e social para o Brasil, gerando empregos e participando de forma positiva para o PIB. A implementação de distintos métodos de cultivo como sistema pleno sol, agroflorestais e cabrucas, quando manejados de forma correta, contribuem para maior produção e geração de renda para o agricultor.
Além disso, as SAF e cabruca podem se apresentar como sistemas de baixos custos e sustentáveis, reduzindo os impactos ambientais e ampliando a biodiversidade da região inserido.
O Estado do Pará destaca-se como uma das principais produtoras de cacau no país.
Em 2019
Produção de amêndoas – 133 mil toneladas
Geração de empregos – 240 mil pessoas de forma indireta e outras 60 mil de forma direta. Na Bahia, três milhões de pessoas são beneficiadas pela produção cacaueira.