O mercado das PANC está em franca expansão, mas ao mesmo tempo é incipiente, já que são plantas pontuais e locais. A maioria das PANC não tem uma escala de produção tão representativa e nem cadeia produtivas estabilizadas.
São pequenos agricultores e agricultoras no Brasil e mundo afora que vêm comercializando, a cada ano, um pouco mais. As PANC podem ser verduras, hortaliças, flores alimentícias não convencionais, frutas silvestres etc.
Segundo Valdely Kinupp, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (IFAM-CMZL) e fundador-curador do Herbário EAFM deste instituto, o acrônimo “PANC” surgiu em 2008. Criador e divulgador do conceito, Valdely usou a expressão ‘plantas alimentícias não convencionais’ em sua tese de doutorado, ainda em 2007.
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Valorização
O pesquisador destaca que esse mercado é jovem, mas tem um grande futuro pela frente. “O movimento PANC no Brasil, de valorização de difusão das PANC, é um adolescente de 13 anos, rebelde. E eu falo que daqui a mais 13 será um/a jovem imponente de 26 anos. Nós fizemos uma revolução no campo, na cozinha, que está em plena expansão. Ainda é uma grande bolha dos produtores, dos compradores/consumidores. Mas, com o fortalecimento da alta culinária, da gastronomia requintada, da alta gastronomia, as PANC começaram a chegar a restaurantes diversos”, afirma Kinupp.
O meio digital também já vem dando destaque para as plantas não convencionais. “Atualmente há muitos canais no Youtube, perfis no Instagram, Facebook e outros difundindo esse conceito, assim como as mídias sociais e programas de TV. Eu mesmo tenho um programa no Amazon Sat, que é um canal que é a cara e a voz da Amazônia, e o canal no Youtube, Sítio PANC”, completa o criador do conceito.
Além de ser pioneiro no tema, Valdely também tem o mérito de ter a tese mais baixada em toda a história da Faculdade de Agronomia – já são mais de 50 mil downloads e acessos.
O professor ainda é autor do livro ‘Plantas Alimentícias não Convencionais (PANC) no Brasil’, um best-seller com 60 mil exemplares impressos espalhados pelo mundo (www.plantarum.com.br). Quando perguntado sobre a obra, ele a define como um ‘divisor de águas’. “Depois de todo esse trabalho, com muitas palestras, oficinas de campo e cozinha, conferências pelo Brasil e fora do País, podemos dizer que há 20 anos estou nessa causa”, explica.
Futuro promissor
O assunto PANC poderia melhorar a economia e a saúde do País, segundo Kinupp, com a diversificação do nosso cardápio e da matriz agrícola. “A matriz agrícola precisa fugir dessa monotonia, seja na mesa ou nos cardápios, o que gera monotonia no campo, com as grandes monoculturas. Nós, brasileiros, achamos que temos que comer pão, e os derivados do trigo todos os dias, bem como arroz, feijão, as mesmas frutas, as mesmas verduras, as mesmas poucas flores alimentícias, as geleias muito limitadas, os vinhos, cerveja e frisantes. Com as PANC, podemos transformar qualquer ambiente em solo agricultável”, garante.
A redução da fome no Brasil e no mundo é outra questão. As PANC têm uma ligação estreita com os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), da agenda 2030, especialmente com o ODS número 2, que é o fome zero, ou redução da fome no planeta.
Com a melhoria de qualidade de vida na cidade, a diversificação dos cardápios e a conservação da natureza, como reduzir o uso de agrotóxicos, evitar a poluição dos recursos hídricos, do solo, da atmosfera, e evitar queimadas, já estaremos no caminho.
Para todos
As PANC são adaptadas para todos os ambientes, desde relevos acidentados, a solos arenosos e salinos. “Das dunas, restingas, cerrado, caatinga, do pampa, da mata atlântica, da amazônia, enfim, dos seis biomas brasileiros, todos possibilitam o plantio de PANC. E claro, em nível planetário, a gente tem PANC adaptada pra taiga, tundra, savana etc.”, diz Kinupp.
O conceito planetário, global, precisa ser pensado da mesma forma, mas agindo localmente e internamente. “Essa é a explicação da nossa hashtag #pancnaveia, um trocadilho que ressalta a importância dos nutrientes das PANC circularem realmente no nosso sangue a partir de um alimento negligenciado, subutilizado ou mesmo desconhecido, que são vistos por muitos como ‘matinhos’. Então, é literalmente do mato para o prato, converter aquilo que era tido como mato em um prato requintado”, define o especialista.
Ainda segundo ele, as PANC, via de regra, são mais nutritivas que plantas similares convencionais, por estarem em seu habitat naturalmente, não demandarem tantos insumos externos, que é agroecologia, e por isso podem ser produzidas com os recursos locais.
“A agricultura do sol, ou seja, a fotossíntese, que produz biomassa para ser incorporada no solo. É o que a gente faz aqui no Sítio PANC, e que a maioria das agroflorestas biodiversas do Brasil e do mundo fazem. Nosso planeta está aqui, é fácil salvá-lo. Temos conhecimento, tecnologia, profissionais qualificados, só basta ter iniciativa e vontade”, avalia o profissional.
Benefícios alimentícios
Boa parte das PANC são muito ricas em antioxidante, compostos fenólicos, vitamina C, A, vitamina do complexo B, não só B1, mas também B2 e até B3, que é muito mal conhecida e está sendo pesquisada agora pela Unicamp, pela equipe da doutora Gláucia Maria Pastore.
Nas PANC estão incluídas as castanhas, flores, hortaliças folhosas, entre outras, que, via de regra, são muito nutritivas e interessantes. Kinupp espera que, nesse século 21, o Brasil saia na frente e comece a incorporar na matriz agrícola outras espécies, especialmente as nativas, ou pelo menos adaptadas aos diferentes biomas do Brasil, seja de São Paulo, do Vale do Paraíba, ou outras áreas degradadas pela exploração predatória.
Quebra de paradigmas
A agroecologia, agrofloresta e as PANC vêm para diversificar as paisagens e romper com os impérios agroalimentares, “com a ditadura dos supermercados, que nos impõem consumo em geral de 10 a 20 plantas por dia, cerca de 100 espécies por ano, no máximo, para quem tem uma alimentação mais balanceada. Então, essa monotonia é um grande problema”, acrescenta o especialista no assunto.
No livro de Kinupp, ele aborda 1.053 receitas ilustradas e 351 espécies de plantas, ou seja, praticamente uma PANC por dia do ano. Ele presume que tenhamos umas 10.000 espécies de plantas autóctones, indígenas, nativas, dos diferentes biomas do Brasil com potencial alimentício.
“Ainda há muita coisa para ser estudada e precisamos de políticas públicas, dentro do Ministério da Agricultura, da Saúde e da Educação. Precisamos de capacitação na formação de pessoas junto às universidades e institutos, à Embrapa e Emater, e outros órgãos de ensino, pesquisa e extensão”, conclui, sempre esperançoso em um futuro melhor.