Claudimir Pedro Penatti
Consultor de Produtos do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)
O solo, considerado um compartimento terrestre, apresenta um dinamismo muito grande em seus compartimentos e está intimamente ligado às suas características e aos processos que ocorrem na atmosfera, hidrosfera, litosfera e biosfera. Nesse sentido, a fase sólida é constituÃda da fração mineral e orgânica.
A fração matéria orgânica corresponde à Matéria Orgânica do Solo (MOS), constituÃda basicamente de carbono (C), hidrogênio (H), oxigênio (O), nitrogênio (N), enxofre (S) e fósforo (P).
Composição da matéria orgânica do solo
C ” 58% H ” 6% O ” 33% N, S e P ” 3% |
Nesses termos, a MOS é heterogênea, constituÃda de matéria orgânica viva e não vivente. Como MOS, entendem-se todos os organismos vivos e seus restos que se encontram no solo, nos mais variados graus de decomposição. Já a MOS não vivente é representada, sobretudo, pelas frações orgânicas estabilizadas na forma de substâncias húmicas.
Quanto aos fatores físicos, químicos e biológicos do emprego da MOS na cultura da cana, pode-se considerar:
- Ø Fator químico
“¢ Poder tampão: aumento do poder tampão do solo decorrente da reação do cálcio com os grupamentos carboxÃlicos dos ácidos húmicos e fúlvicos. Dessa forma, a adição de MO resultará em aumento ou redução do pH do solo, dependendo da predominância dos processos que consomem ou liberam hidrogênio;
“¢ Capacidade de Troca Catiônica (CTC): a MOS contribui com 20 a 90% da CTC das camadas superficiais de solos minerais e praticamente de toda a CTC de solos orgânicos. Na cana-de-açúcar, a CTC do solo é aumentada com o incremento do estoque de carbono orgânico total com a aplicação de vinhaça, torta de filtro e manutenção da palha em cobertura dos solos. A rotação de culturas (soja e amendoim) e o uso de adubo verde (crotalárias, milheto, leguminosas etc.) em áreas de reforma do canavial também proporcionam aumento da CTC do solo, além da reciclagem de nutrientes;
“¢ Complexação de metais: a complexação ocorre devido à presença de vários grupamentos funcionais (carboxÃlicos e fenólicos) na MOS, podendo complexar metais tóxicos para a planta (ex.: Al, Fe e Mn) e metais essenciais para ela (macro e micronutrientes). Os nutrientes são liberados lentamente, reduzindo as perdas por lixiviação no perfil do solo.
- Ø Fator físico
“¢ Agregação: os agregados protegem fisicamente a MOS por formar uma barreira física aos microrganismos e suas enzimas aos substratos. A palha da cana que fica sobre o solo após as colheitas compõe um emaranhado de raízes (colchão de palha) com microrganismos (hifas de fungos), podendo formar também um emaranhado de microagregados;
“¢ Retenção de água: a MOS, de forma geral, pode reter até 20 vezes sua massa em água (STEVENSON, 1994). A importância da MOS na retenção de água depende da textura do solo, sendo mais sensÃvel à quantidade de MOS dos solos de textura arenosa quando comparados aos de textura argilosa. De forma geral, os solos arenosos apresentam baixo teor de MOS (menor ou igual a 2%), e os argilosos, igual ou acima de 3%. A torta de filtro, compostada ou não e aplicada no sulco de plantio, irá reter água, além de fornecer nutrientes.
- Ø Fator biológico
“¢ Reserva metabólica de energia: a MOS tem como função básica promover os processos biológicos dos solos. Vale ressaltar que uma diversidade de compostos orgânicos entra no solo, servindo de substrato para os macro e microrganismos, podendo ser assimilados, liberados como produtos metabólicos ou respirados como CO2. Esse processo é chave para a manutenção da ciclagem de nutrientes e preservação dos nutrientes em formas disponíveis para as plantas;
“¢ Compartimentos e decomposição de nutrientes em forma orgânica: além dos mecanismos que envolvem os fenômenos de troca catiônica e complexação que atuam na disponibilidade de macro e micronutrientes, os nutrientes são estocados (imobilizados) e/ou liberados (mineralizados) na MOS pelos processos mediados pelos organismos do solo na liberação de N, P e S, principalmente. Cerca de 95% do N do solo estão associados à matéria orgânica.
Benefícios da matéria orgânica
A matéria orgânica é um componente chave para a manutenção da qualidade física, química e biológica dos solos e, como consequência, para a sustentabilidade dos canaviais, além dos sistemas produtivos em médio e longo prazo.
Especialmente para a cultura da cana-de-açúcar, as atenções se voltam para o papel da MOS no sequestro e ciclo global do carbono. A palha da cana deixada sobre o solo tem sido o foco principal para esse processo, com a eliminação da queimada.
Além disso, o uso de subprodutos do setor sucroenergético (torta, vinhaça, fuligem e cinza) recupera a fertilidade do solo e aumenta a produtividade por área colhida. A cana-de-açúcar é a única cultura que consegue aproveitar todos os seus subprodutos gerados, reciclando nutrientes e aumentando a produtividade no que concerne à adubação mineral.
Resultados
Com a matéria orgânica, observa-se aumento da produtividade de cana (toneladas por hectare) com o uso agronomicamente adequado dos subprodutos, incrementando entre cinco e 10 t de cana/ha a mais em relação ao uso de adubo mineral.
Na fabricação de açúcar e álcool de cana-de-açúcar, podem ser gerados até 14 kg de fuligem e 4 kg de cinzas por tonelada de bagaço queimado nas caldeiras, além de outros subprodutos não menos importantes, como vinhaça (10 a 15 m-3 de álcool produzido), torta de filtro (20 a 40 kg t-1 de cana-de-açúcar), bagaço (220 kg/t-1 de cana) e lodos (15 a 40 kg/t-1 de cana) que são utilizados na agricultura.
“¢ Torta de filtro: esse subproduto pode ser usado in natura ou compostado com outros subprodutos, sendo aplicado no sulco de plantio ou sobre as linhas das soqueiras, o que melhora as condições físicas, químicas e biológicas do solo e, consequentemente, aumenta a produtividade do canavial;