Autores
Dayane Salinas Nagib Guimarães – Doutoranda em Agronomia – Universidade Federal de Uberlândia (UFU) – dayane_salinas@hotmail.com
Poliana S. Franco Ferreira – Engenheira agrônoma – UFU
No âmbito do agronegócio mundial, a produção de soja está entre as atividades econômicas que, nas últimas décadas, apresentou um dos crescimentos mais expressivos. A soja é a principal commodity do agronegócio brasileiro, representando 51% do total de grãos produzidos no Brasil (MAPA, 2019), e segundo a CONAB (2020), a safra 2019/20 bateu recorde de produção, com quase 125 milhões de toneladas de soja em 36,80 milhões de hectares.
Das tecnologias que têm sido empregadas visando obter incrementos na produtividade da cultura da soja, inclui-se o uso crescente de sementes de variedades geneticamente melhoradas, associadas a aplicações de fungicidas, inseticidas, reguladores de crescimento e inoculantes.
Entenda melhor
Os inoculantes são insumos biológicos que contêm microrganismos com ação benéfica para o desenvolvimento das plantas, podendo ser encontrados, principalmente, na forma líquida e turfosa. Os inoculantes contendo bactérias formadoras de nódulos nas raízes das plantas, com objetivo de fixar nitrogênio, são desenvolvidos e produzidos de acordo com protocolos já estabelecidos.
A inoculação de microrganismos é de grande importância para as culturas, principalmente para a soja, pois a fixação biológica de nitrogênio (FBN) representa um dos pilares de sustentabilidade do sistema de produção de soja no Brasil e resulta em grande benefício, tanto para o produtor quanto para o meio ambiente, por dispensar o uso de fertilizantes nitrogenados na cultura.
Esse processo se dá pela simbiose entre bactérias diazotróficas associativas, como por exemplo, as do gênero Bradyrhizobium, localizadas em nódulos radiculares, as quais utilizam como substrato o N2 atmosférico.
O processo de FBN é essencial para que a produção da soja seja economicamente viável, e de acordo com Hungria et al. (2001), para produzir uma tonelada de grãos de soja são necessários, aproximadamente, 80 kg de N ha-1.
Por que tratar as sementes
Apesar de a tecnologia de inoculação ser aplicada na maioria das lavouras de soja do País, o uso de tratamentos de sementes tradicionais, com produtos químicos como inseticidas, fungicidas, nematicidas e, por vezes, micronutrientes, a fim de melhorar a nutrição nas fases iniciais da cultura, geralmente trazem prejuízos à população bacteriana (Pastore, 2016).
Do ponto de vista molecular, Fabra et al. (1998) e Dunfield et al. (2000) relataram que determinados fungicidas podem causar alterações bioquímicas, influenciando as taxas de crescimento e propriedades simbióticas de Bradyrhizobium spp. Por este motivo, deve-se atentar principalmente às misturas de fungicidas e inseticidas, verificando a compatibilidade com as diversas bactérias associativas.
Devido a esses possíveis efeitos antagônicos que geram a mortalidade das bactérias, normalmente recomenda-se que a semeadura ocorra imediatamente após a inoculação, preferencialmente no mesmo dia (Embrapa, 2013). Esta operação é frequentemente descrita como uma atividade que reduz a eficiência da semeadura, em razão do tempo desprendido para sua operação. Por vezes, essa dificuldade tem sido responsável pela não utilização da inoculação na cultura por parte dos agricultores (Campo; Hungria, 2007).
Em função disso, algumas empresas estão adotando o processo de tratamento de sementes antecipado ou tratamento industrial de sementes (TSI), antes do ensaque ou no momento da entrega do produto ao agricultor. Este tipo de tratamento vem ganhando espaço no mercado, pois os produtos utilizados no TSI apresentam em sua formulação inoculantes conhecidos como “longa vida”.
Vantagens
Os inoculantes longa vida têm a capacidade de preservar a viabilidade das células bacterianas após serem aplicados na semente, expandindo a janela entre a inoculação e o plantio por até 60 dias.
Essa tecnologia inovadora possibilita a inoculação antecipada, e sua aplicação no TSI possui como objetivo principal facilitar a operação de semeadura. Os pré-inoculantes apresentam altas concentrações de bactérias, contendo o dobro de microrganismos quando comparados aos inoculantes convencionais e alta compatibilidade com os tratamentos de sementes.
As células de bactérias diazotróficas aplicadas sobre as sementes de soja podem perder a viabilidade rapidamente por meio de ressecamento, altas temperaturas e até mesmo estresse osmótico. No entanto, os inoculantes longa vida possuem protetores celulares na composição que auxiliam na preservação destas bactérias.
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Inovações
Os protetores celulares geralmente têm formulações com bases lipídicas e substâncias oligossacarídicas, que possibilitam à célula do microrganismo a formação de um microambiente na semente, reduzindo o efeito oxidativo das membranas celulares.
A grande vantagem da utilização desta nova linha de inoculantes é a eliminação do tratamento on farm (tratamento de semente realizado pelo produtor na fazenda momentos antes do plantio).
A semente pronta para usar, sistema “abre e plante”, permite diminuir os custos, simplificar as operações de semeadura e minimizar os riscos do tratamento a campo, além de proporcionar maior estande de plantas saudáveis com ótimo desenvolvimento radicular. Outro fator de grande importância é a correta distribuição dos produtos na semente, realizada de maneira uniforme e nas corretas dosagens, assegurando o vigor e germinação das sementes.
Apesar de muitos autores questionarem a eficiência dos inoculantes longa vida, estudo realizado por Machineski et al. (2015) mostrou que não houve redução significativa do número de células viáveis de Bradyrhizobium spp. do tratamento padrão (inoculação no dia da semeadura) quando comparado com as inoculações feitas aos, 30, 45 e 60 dias.
Nos testes de eficiência dos inoculantes em relação à nodulação, também não houve diferença, demostrando que a pré-inoculação de até 60 dias com inoculante contendo protetor celular e tratamento químico das sementes não afetou a viabilidade das células bacterianas.
Manejo
As sementes tratadas com pré-inoculantes recebem o mesmo manejo que as sementes tratadas com os inoculantes convencionais, sendo o plantio e tratamento fitossanitário iguais. Trabalhos comprovam a eficácia do uso de inoculantes longa vida tanto no desenvolvimento quanto na produtividade das lavouras de soja.
Engroff (2019) avaliou a produtividade das sementes tratadas de soja em resposta à pré-inoculaçao, e percebeu que não houve diferença significativa desse parâmetro quando comparado à aplicação de inoculante turfoso aos 30 dias com a aplicação do inoculante convencional no momento da semeadura.
Como já foi dito anteriormente, o tratamento industrial de sementes tem muita aceitação por parte dos produtores devido às diversas vantagens, porém, a aplicação de pré-inoculantes nem sempre é sinônimo de maiores produtividades, e sim maximização do processo, pelo simples fato de explorar ao máximo os recursos.
Durante o processo do tratamento industrial, a ordem de mistura dos produtos vai depender do equipamento utilizado. A mistura com os fungicidas e inseticidas é totalmente segura, uma vez que se usa isolados de bactérias próprias para este fim.
Custo
Em relação ao custo desta nova tecnologia, quando comparado aos inoculantes convencionais, percebe-se um aumento significativo do valor, podendo chegar a 10 vezes mais. No entanto, os benefícios agregados, já citados anteriormente, justificam o uso, pois possibilita ao produtor uma flexibilidade no momento do plantio, proporcionando a otimização do manejo.
A tecnologia dos inoculantes longa vida com certeza se tornará uma ferramenta fundamental no cenário atual, pois facilita a pré-inoculação das sementes de soja juntamente com o TSI, gerando incrementos na produtividade da cultura. Desta forma, o acesso dos produtores aos inoculantes tende a crescer, pois as dificuldades da manipulação momentos antes do plantio deixa de ser uma barreira.
Para produzir uma tonelada de grãos de soja são necessários, aproximadamente, 80 kg de N ha-1.
Os inoculantes longa vida expande a janela entre a inoculação e o plantio por até 60 dias.
Pesquisas comprovam que não houve redução significativa do número de células viáveis de Bradyrhizobium spp. do tratamento padrão