Lucro pode chegar a 190%
A erva-mate está sendo comercializada não apenas para o uso tradicional, mas também em refrigerantes, temperos, cosméticos e até para a preservação de carnes de frangos nas exportações para o Japão
Ana Carolina da Silva – Engenheira florestal e mestranda em Engenharia Florestal – Universidade Federal do Paraná (UFPR) – anac.florestal@gmail.com
Franklin Galvão – Professor de Engenharia Florestal – UFPR – fgalvao@ufpr.br
A decisão de investir no cultivo de uma espécie bem brasileira, enraizada culturalmente, com volumoso consumo interno e que vem tendo ampla aceitação internacional, pode ser uma excelente opção. Preparamos esse texto para falar um pouco da erva-mate, da sua história, incluindo informações valiosas sobre a maneira de cultivar e colher.
A espécie arbórea da erva-mate (Ilex paraguariensis) é nativa da América Latina, de ocorrência natural no Centro-Norte do Rio Grande do Sul, em quase todo o Estado de Santa Catarina, Centro-Sul e Sudoeste do Paraná, e alguns locais do Mato Grosso do Sul e São Paulo.
A exploração da erva-mate no Sul do Brasil teve uma grande importância, chegando a representar 85% da economia paranaense no século XIX. Seu comércio levou ao desenvolvimento da navegação fluvial nos rios Iguaçu e Paraná e à construção da ligação ferroviária entre Curitiba e o litoral.
Os primeiros mercados externos foram a Argentina e o Paraguai, tendo inclusive se firmado como tradição o consumo do chimarrão (na água quente) ou do tererê (na água fria). A boa notícia é que há menos de uma década os mercados europeus e asiáticos passaram a consumir as diversas variações desse produto.
Exportações e diversificações
As exportações foram crescendo na medida em que a erva-mate passou a ser utilizada em novos e variados produtos. Hoje, há mais de 400 patentes registradas, a maioria no exterior, onde ela está sendo comercializada não apenas para o uso tradicional, mas também em refrigerantes, temperos, cosméticos e até para a preservação de carnes de frangos nas exportações para o Japão.
O mercado da erva-mate
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O mercado da erva-mate já atinge cerca de US$ 1,2 bilhões ao ano e é uma atividade fundamental para a economia de vários municípios do Brasil. A produção brasileira está estimada em 393 mil toneladas ao ano.
O grande produtor ainda é o Estado do Paraná, principalmente a sua região centro-sul, com 87% da produção do País, equivalente a 345 mil toneladas ao ano. No Rio Grande do Sul, o cultivo corresponde a 6% e em Santa Catarina, 5%.
A área plantada no Brasil é de 67.230 hectares, com uma produtividade média de 7.702 kg/ha. A rentabilidade do cultivo da erva-mate gira em torno 42% do valor investido no primeiro ano, podendo tornar-se 190% mais lucrativa nos demais anos, o que é uma excelente alternativa de investimento e aumento de renda.
Técnicas para o cultivo da erva-mate
O bom desenvolvimento do erval depende da escolha de mudas de qualidade e do plantio feito de maneira correta, com as condições adequadas de umidade no solo, adubação e proteção das mudas contra insolação excessiva.
A erva-mate é uma cultura que requer solos profundos e que não possuam histórico de encharcamento. A época adequada para o plantio da espécie é de maio a setembro. O preparo do solo para o recebimento da muda é um dos mais importantes passos para o início do plantio.
Primeiramente, deve ser feita a descompactação do solo e o plantio realizado em covas com 30 cm de profundidade e espaçamento variando de 1,5 m a 4,0 m entre as mudas. As ervas daninhas devem ser erradicadas e controladas, pois elas podem sufocar o crescimento da muda no seu desenvolvimento inicial.
A escolha da muda deve focar em indivíduos com bom enraizamento e sem atrofias. Porém, caso a muda já tenha raízes enroladas, estas podem ser removidas com corte para evitar problemas futuros no desenvolvimento aéreo da planta.
A espécie não se adapta a pleno sol, podendo então necessitar de proteção, que pode ser feito por um pedaço de madeira que garanta sombra à muda nos seus primeiros meses no campo. Já os plantios com adensamento, realizados no sub-bosque de florestas, podem ser realizados durante qualquer período do ano e sem essa proteção.
Tratos culturais para a colheita
A adoção das técnicas corretas de poda possui grande impacto na produção ervateira, mantendo a sanidade da planta e ergonomia para a colheita.
A primeira poda deve ser realizada entre um e três anos após o plantio. Sua função é quebrar o crescimento apical da planta, induzindo o crescimento de brotos laterais que favorecem a produção foliar.
Nas demais podas, quando a muda atingir pelo menos três metros de altura, deve-se eliminar os ramos improdutivos e mortos e adaptar os ramos restantes a uma melhor ergonomia para colheita manual realizada pelo trabalhador. Esse procedimento pode ser repetido a cada 18 meses.
A frutificação da erva-mate ocorre nos meses de janeiro a março. Quando os frutos estão maduros, apresentam uma coloração violeta a roxa. A colheita das folhas pode ser realizada a partir de fevereiro, quando os frutos começarem a cair, lembrando sempre de deixar um remanescente de 20% de folhas nas árvores para sua recuperação pós-colheita.
Pragas e doenças ameaçadoras
Os principais fungos que afetam o cultivo de erva-mate são a antracnose, fuligem, roseliniose e a pinta-preta. Eles podem ser controlados por fungicidas ou podando os ramos infectados.
Já os insetos que mais atacam este cultivo são a broca-da-erva-mate, ampola-da-erva-mate, cochonilha-de-cera e a lagarta-do-cartucho-de-cera. O controle deve ser feito por poda e queima dos ramos afetados, ou com o uso de inseticidas.
Aumento do consumo durante a pandemia
Devido ao isolamento social adotado como forma de diminuir os impactos da pandemia da Covid-19, mais pessoas estão permanecendo em casa e o chimarrão, antes consumido em grupos, passou a ser tomado individualmente. Esta pequena diferença fez com que as vendas no Rio Grande do Sul aumentassem em 20%.
Pesquisa avalia biológicos para lagarta da erva-mate
Com o anúncio da destinação de emendas parlamentares para pesquisas com erva-mate, dois estudos no Paraná vão focar no controle de pragas importantes para a cultura: a Embrapa Florestas vai pesquisar lagartas que atacam os ervais e a Unioeste vai pesquisar a ampola-da-erva-mate.
A terceira pesquisa que vai receber recursos é do campus de União da Vitória, do Instituto Federal do Paraná, que pretende estudar a composição química da erva-mate da região, em especial a do tipo sombreado. Estão previstos R$ 609 mil para as três pesquisas. As emendas são resultado de articulação do Cogemate com as instituições de pesquisa e o poder legislativo do Paraná.
Preocupação
As lagartas desfolhadoras da erva-mate têm preocupado o setor ervateiro pelos danos causados à cultura. As espécies Thelosia camina, conhecida popularmente como ‘lagarta-da-erva-mate’, e Hylesia sp., chamada de lagarta-do-cartucho-da-erva-mate, são altamente vorazes e se alimentam tanto de brotações como de folhas mais velhas.
Atualmente, a recomendação para o controle das lagartas está baseada em medidas culturais ou mecânicas, como a coleta dos adultos com armadilhas e eliminação de folhas contendo posturas. Entretanto, essas medidas não são suficientes para controlar a população dessas pragas.
O uso de inseticidas químicos, além de não ser amparado por registro para uso em erva-mate, pode apresentar desvantagens, como alterações ambientais, desenvolvimento de resistência e elevação do grau de pragas para algumas espécies que eram consideradas inócuas. A inexistência de produtos testados e registrados para a cultura dificulta ainda uma avaliação da eficácia desses produtos a campo.
Assim, o uso de inseticidas biológicos surge como opção para os ervais. Já foram identificados produtos biológicos à base de Bacillus thuringiensis que apresentam potencial para uso no controle das lagartas desfolhadoras da erva-mate. Porém, nenhum deles apresenta registro junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para a erva-mate, o que torna seu uso ilegal para esta cultura.
Com os recursos previstos pelas emendas parlamentares, a equipe de pesquisadores da Embrapa Florestas vai, em um primeiro momento, articular a realização de testes destes produtos à base de Bacillus thuringiensis já existentes, que hoje são utilizados em várias culturas, como soja, trigo, algodão, cana-de-açúcar, milho, entre outras, para comprovar a sua eficácia nos ervais. Com os resultados, será possível o segundo passo, que é viabilizar a “extensão de uso” para a cultura da erva-mate junto ao Mapa.
A pesquisadora Susete Chiarelllo Penteado, responsável pela condução dos trabalhos na Embrapa Florestas, explica: “já foram identificados produtos biológicos que podem trazer bons resultados no controle das lagartas, além de beneficiar aspectos sociais, ambientais e produtivos da cadeia ervateira. Na sequência, a Embrapa Florestas irá trabalhar junto aos produtores e extensionistas para capacitá-los sobre a correta utilização do produto biológico, garantindo, assim, a sua eficácia”.
Controle biológico
Os produtos à base de Bacillus thuringiensis são inseticidas biológicos que atuam por ingestão, causando a ruptura na membrana do sistema digestivo das lagartas de lepidópteros. Algumas horas após a ingestão do produto, as lagartas cessam a atividade de alimentação e sua morte ocorre após 24 a 48 horas.
Devido à ação por ingestão, é fundamental que a tecnologia de aplicação permita uma boa cobertura de toda a planta. Para maior eficiência, também é necessário sincronizar a aplicação com o momento de máxima atividade e suscetibilidade das lagartas, que ocorre nos primeiros estágios larvais.
Lagartas desfolhadoras
Ü Thelosia camina (lagarta-da-erva-mate): geralmente realizam as posturas na parte superior das folhas, com uma média de 81 ovos por postura. O período de incubação é de 15 a 16 dias. O período de ocorrência das lagartas é de setembro a março, podendo, eventualmente, ocorrer a partir de julho.
O pico populacional, normalmente, se dá no início de dezembro. Completando o desenvolvimento larval, as lagartas deixam a planta e vão para o solo onde penetram a uma profundidade média de 5,0 cm, e passam o período de pupa, que varia de 8,0 a 10 meses.
Ü Hylesia sp. (lagarta-do-cartucho-da-erva-mate): estas mariposas medem em torno de 40 a 45 mm de envergadura. Suas posturas são realizadas sobre as folhas ou galhos da erva-mate, em ootecas marrom-claras, com cerca de 1,0 cm de diâmetro, contendo centenas de ovos.
As larvas da espécie Hylesia sp., no final do desenvolvimento, são de coloração cinza-escuro e possuem hábito gregário. Para se protegerem, tecem fios de seda, formando uma espécie de cartucho, onde vivem centenas de lagartas.
A época de ocorrência das lagartas se dá, geralmente, entre os meses de setembro e novembro. O empupamento ocorre, geralmente, na planta, em um casulo formado por folhas com fios de seda. Podem, também, empupar no solo entre folhas secas. Além dos danos na planta, esta espécie provoca irritação e queimaduras na pele, por apresentarem pelos urticantes, sendo um problema durante a colheita da erva-mate.
– A área plantada no Brasil é de 67.230 hectares, com uma produtividade média de 7.702 kg
– A produção brasileira está estimada em 393 mil toneladas ao ano
– A rentabilidade da erva-mate gira em torno 42% do valor investido no primeiro ano, podendo tornar-se 190% mais lucrativa nos demais anos