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Fruteiras em sistemas de produção de baixa emissão de carbono

Renata Elisa ViolEngenheira agrônoma e doutora em Fitotecnia – Universidade Federal de Lavras (UFLA)renataviol@live.com

Pomar – Foto: Shutterstock

Dentre os Gases de Efeito Estufa (GEE) emitidos pelas atividades humanas, o gás carbônico (CO2) é responsável por cerca de 70% do potencial de elevação da temperatura terrestre. Nos últimos 250 anos, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou 31%, alcançando o mais alto nível observado nos últimos 420 mil anos.

O solo é considerado o principal reservatório temporário de carbono em um ecossistema, pelo carbono estocado nos perfis de solo. Entretanto, o carbono é um componente dinâmico e sensível ao manejo realizado no solo. Seu conteúdo encontra-se estável sob condições de vegetação natural, porém, com a quebra do equilíbrio pelo cultivo do solo em preparo convencional, geralmente ocorre redução no seu teor, resultado das novas taxas de adição e de perda.

A base

O solo se constitui num compartimento-chave no processo de emissão e sequestro de carbono, pois em termos globais, há duas a três vezes mais carbono nos solos em relação ao estocado na vegetação e duas vezes mais em comparação à atmosfera.

Assim, manejos inadequados do solo podem assumir um papel desastroso, pois podem mineralizar a matéria orgânica e emitir grandes quantidades de GEE para a atmosfera. Isto demonstra o grau de importância que manejos ecológicos de solos representam para o planeta atualmente.

Os solos em pomares de frutíferas de clima temperado desempenham um papel importante no ciclo do carbono. O acúmulo de carbono orgânico no solo (COS) ocorre pela deposição de material orgânico (serapilheira) na superfície do solo e da rizodeposição no ambiente radicular.

Relação direta

O carbono orgânico está diretamente relacionado com a fertilidade, qualidade e saúde do solo. Em solos saudáveis, com teores significativos de carbono orgânico, as frutíferas de clima temperado são capazes de obter crescimento ótimo e assim armazenar maior quantidade de carbono em seus órgãos vegetais.

Este processo acaba gerando um feedback positivo, pois a planta devolve o carbono ao solo pela deposição de serapilheira e armazenamento direto de carbono no subsolo por via radicular a partir da rizodeposição como descrito anteriormente.

 No Brasil, as queimadas e o desmatamento são as principais causas da emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE), responsáveis pelo aquecimento global. A agricultura e pecuária também contribuem para o aumento dos GEE com o uso intensivo de fertilizantes nitrogenados que liberam óxido nitroso, os processos digestivos dos ruminantes que emitem metano, a produção de dejetos animais, os processos anaeróbicos de decomposição da matéria orgânica e a liberação de CO2 pelas máquinas agrícolas que funcionam com combustível fóssil.

Consequências

Dentre as inúmeras consequências da elevação de temperatura da Terra, estão os prejuízos que mudanças climáticas podem causar à agricultura, ameaçando a produção de alimentos, condição vital para a sobrevivência humana no planeta.

Porém, existem outras formas de utilizar a terra que podem causar efeito inverso, incrementando o conteúdo de carbono no solo e na vegetação ao aumentar as quantidades de dióxido de carbono capturado, sem produzir um efeito aditivo às emissões oriundas de combustíveis fósseis.

A agricultura orgânica pode ser uma estratégia de manejo para sequestrar C em vez de emiti-lo na atmosfera. Sistemas de produção que utilizam técnicas de reciclagem de MO associadas a práticas agroecológicas confirmaram alto potencial para sequestro de C atmosférico, elevando o C orgânico do solo e reduzindo emissão de CO2, principal gás de efeito estufa.

E as frutas?

Os pomares de frutíferas apresentam um grande potencial no sequestro de carbono no solo devido ao seu tempo de vida útil e a partir da adoção de práticas sustentáveis, melhorando os serviços ecossistêmicos desempenhados pelo ecossistema solo.

A fruticultura convencional brasileira, em grande parte, preconiza o preparo excessivo do solo, por meio de arações e gradagens. Essas práticas promovem a desestruturação do solo, ou seja, perda das suas propriedades físicas que, aliado à ausência de resíduos vegetais, reduzem também suas propriedades biológicas e químicas.

Essa situação contribui para a emissão de gases de efeito estufa pela perda da matéria orgânica do solo e de nutrientes, além de favorecer os processos erosivos e de salinização e/ou sodificação, ocasionando prejuízo ao desenvolvimento da cultura e a degradação severa da área produtora.

Soluções

As práticas de cultivo mínimo do solo, a incorporação de restos culturais e resíduos orgânicos, a adubação verde e as rotações utilizando cultivos de cobertura com gramíneas ou leguminosas retêm o carbono nos solos por décadas, inclusive séculos.

Baseado nesses relatos e como as práticas da agricultura orgânica pressupõem o emprego de todas essas estratégias, estas se apresentam como excelentes alternativas para fixação do carbono e a redução do principal gás de efeito estufa, o CO2.

Em sistemas orgânicos de produção de fruteiras, pressupõe-se a reciclagem de resíduos orgânicos, como estercos de animais para inoculação de compostos, fato que contribui para elevar o estoque de carbono do solo, visto que estes retornariam para a atmosfera na forma de CO2, se não fossem reciclados.

As adubações dos solos com composto orgânico também contribuem significativamente para o aumento do estoque de carbono do solo, pela sua rica composição em matéria orgânica.

Produtividade

Os teores de carbono orgânico no solo, além de alterarem as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo, tem relação direta com a produtividade primária líquida nos ecossistemas agrícolas e naturais.

Estudos têm demonstrado que a maior produtividade de frutíferas de clima temperado pode ser alcançada a partir do incremento nos teores de carbono no solo, bem como esses podem servir como sumidouros de carbono atmosférico, equilibrando a relação do carbono sequestrado versus carbono liberado por meio da decomposição, criando um feedback positivo.

O carbono orgânico no solo apresenta alta correlação com os nutrientes importantes para o desenvolvimento das culturas (N e P) e com a produtividade em pomares de frutíferas de clima temperado.

Nutrição

O fósforo é um dos três macronutrientes primários mais importantes para as plantas, juntamente com o nitrogênio e potássio Em pomares de sistemas orgânicos que apresentam solos com pH baixo, ocorrendo a deficiência de P, um fator muito importante é a simbiose entre as plantas com espécies de fungos micorrízicos arbusculares, que auxiliam na absorção de P, sendo que sistemas orgânicos apresentam melhores condições para a qualidade microbiana do solo.

Outro fator importante para a absorção de fósforo pelas plantas é a quantidade de matéria orgânica, pois esta interage com os óxidos de alumínio e ferro, ocasionando uma diminuição em seus sítios de fixação e permitindo um melhor aproveitamento de fósforo disponível no solo para as plantas.

O nitrogênio é um nutriente de fundamental importância no solo, tanto para produção primaria líquida quanto para a atividade da biota edáfica. Dessa forma, a aplicação de compostos orgânicos deve levar em consideração os teores de N.

As condições climáticas de uma região particular afetam a taxa de decomposição dos resíduos e seu acúmulo na forma de CO no solo. Sendo assim, regiões com temperaturas elevadas, típicas de clima tropicais, especialmente acima de 20°C, requerem maiores quantidades de resíduos agrícolas retornados aos solos, para manutenção ou elevação dos níveis de MOS.

Essas condições climáticas favorecem a decomposição da MOS, armazenando menos C em relação a regiões de clima temperado. Apesar dessa maior taxa de decomposição de MOS, os solos em regiões de clima tropical estocam 32% do total de C orgânico contido nos solos do planeta.

Vantagens

Sistemas orgânicos de produção frutícola que se baseiam em princípios ecológicos podem contribuir significativamente para o sequestro de carbono atmosférico. Dentre estes, destacam-se:

– Sistema diversificado com preservação parcial da vegetação nativa local;

– Fixação de carbono por área em capineiras utilizadas para produção de biomassa para a compostagem orgânica;

– Reciclagem de resíduos orgânicos pela compostagem orgânica, para produção de adubo orgânico para as culturas;

– Plantio direto sobre palhadas de adubos verdes;

– Cultivo solteiro de adubos verdes em rotação, visando proteção do solo e fixação de carbono e nitrogênio;

– Manutenção de corredor de refúgio com espécies espontâneas, visando manter a estabilidade ecológica e controlar a erosão;

 – Manejo da vegetação espontânea entre as linhas de cultivo, pela técnica da capina em faixa, proporcionando proteção do solo, maior diversidade, equilíbrio ecológico, controle de erosão e ciclagem de nutrientes no perfil do solo;

 – Manutenção da vegetação espontânea entre os canteiros pela roçada, para proteção do solo, para refúgio de predadores, proteção do solo e ciclagem de nutrientes;

 – Emprego da adubação em cobertura para melhoria nutricional das culturas, empregando-se composto orgânico e biofertilizantes líquidos;

Responsabilidade

Existe um compromisso nacional com a nova versão do Plano Setorial de Adaptação e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária (Plano ABC+), que pretende cortar a emissão de carbono em 1,1 bilhão de toneladas até 2030. Para tanto, são necessárias diferentes ações que comtemplam a redução das taxas de desmatamento, a ampliação da eficiência energética e um plano específico para ações no setor agrícola,

A promoção de oito formas de tecnologia está prevista no Plano ABC+: a recuperação de áreas degradadas; o plantio de 4,0 milhões de hectares de florestas; o tratamento de resíduos animais; a terminação intensiva de pastos; o uso de microrganismos a partir de bioinsumos; plantio direto com o mínimo de reviramento de solo e cobertura permanente com plantas vivas ou palhada; sistemas de irrigação eficientes que consumam pouca água; e sistemas integrados de plantio entre culturas diferentes e hortaliças.

Nesse sentido, o entendimento conceitual da Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, traduzido em processos e tecnologias aplicadas, é importante para que os agricultores possam implantar sistemas de produção sustentáveis.

Assim, o aumento dos estoques de carbono no solo, condicionado ao retorno de maiores quantidades de resíduos vegetais e ao mínimo distúrbio do mesmo, bem como a inclusão de leguminosas para reduzir a utilização de fertilizantes sintéticos, por meio da fixação biológica de nitrogênio (FBN), são estratégias de mitigação às mudanças climáticas globais, que visam também manter e/ou aumentar os níveis de produção, contribuindo para a sustentabilidade.

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